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DESIGN
A máquina busca o belo
MARA GAMA
Gerente-geral de Criação do UOL
Lançado há dois
anos nos EUA, "A
Beleza das Máquinas", de David Gelernter, usa a história recente da indústria de computadores para
propor que a busca do belo orienta o desenvolvimento científico e
tecnológico.
Gelernter, professor de ciência
da computação em Yale, colunista de jornais, autor de vários livros
e de um projeto da linguagem de
computação, foi também uma
das vítimas do Unabomber.
Em junho de 1993, o professor
abriu uma das cartas-bombas enviadas pelo terrorista e se feriu
gravemente. Ainda traz sequelas
na mão e no olho direitos. Em
1997, lançou "Drawing Life", que
conta o episódio.
"A Beleza das Máquinas" se
apóia em duas teses. A mais importante é a idéia de que a beleza
da máquina é o motor da tecnologia e da ciência e que ela foi crucial
para o desenvolvimento da computação. Mas o que é beleza da
máquina? Para Gelernter, é o "casamento" de eficiência e simplicidade. Como reconhecê-la? "Prever a forma que parece inevitável,
criar a "ilusão da inevitabilidade"
-a impressão de que estamos
olhando para a materialização genuína da ciência ou da engenharia- é uma arte, pura e simplesmente, esteja você projetando represas ou aspiradores de pó."
A outra tese do livro é a idéia de
que a beleza da máquina ""incomoda". Para Gelernter, há uma
resistência quase generalizada
contra a aceitação da beleza como
valor essencial dos objetos, por
razões ideológicas e culturais.
Gelernter talvez tenha considerado a formulação "ben trovata" e
a ela se apega. Não dá para dizer
que é verdade ou mentira, mas isso não compromete de modo algum a leitura do livro. O que importa é que o autor usa essa tese
para avacalhar, com extremo
bom humor e conhecimento de
causa, a formação de cientistas e
tecnólogos, a indústria de software e hardware, programadores,
usuários e criadores da indústria
da computação, os computadores
beges e sem graça, os programas
chatos e complicados.
Há também, para Gelernter, um
grau superior dessa união de eficiência e simplicidade, a "beleza
profunda", atingida quando se
unem os mecanismos da ciência e
da engenharia. Em outras palavras, quando o projeto parte de
uma concepção científica por si
só brilhante e se materializa em
objeto ou tecnologia também
simples e eficiente. Para exemplificar esses conceitos, Gelernter
usa a história de clássicos do desenho industrial e da engenharia,
começando pela máquina copiadora desenhada por Raymond
Loewy, em 1929, objeto que esteve
em linha de produção por 40
anos, passando pela cadeira Cesca, de Marcel Breuer, pela locomotiva a vapor J3, criada por
Henry Dreyfuss, chegando à teoria física da supersimetria.
A visão da história do desenvolvimento tecnológico pelo viés estético não é novidade, embora o
autor consiga ainda aí propor um
olhar diferenciado.
Mas é sobretudo nas passagens
sobre a gênese do conceito e da
tecnologia que permitiu o aparecimento do "desktop" que o texto
de Gelernter torna-se mais interessante e rico.
Uma pena que o livro tenha sido
escrito antes da popularização
dos novos Macs, que pontuaram,
de alguma forma, a "frota" internacional de computadores, senão
com "beleza profunda", pelo menos com um pouco de graça. Dá
vontade de saber como seria o livro se tivesse sido escrito depois
que o estilo i-Mac superou os
computadores e chegou até os
ferros de passar roupa, que exibem agora seus mecanismos sob
uma capa transparente e colorida.
Avaliação:
Livro: A Beleza das Máquinas
Autor: David Gelernter
Tradutora: Laura Neves
Editora: Rocco
Quanto: R$ 26 (172 págs.)
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