Peça com Marina Corazza e Natacha Dias estréia hoje no Sesc Avenida Paulista

VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Escrever, pensar e falar, não necessariamente nessa ordem, são as ações de dentro e de fora na paisagem dramatúrgica de "Seis da Tarde". Duas mulheres trocam cartas por cinco anos, sem se conhecerem pessoalmente. Atravessam igual período em silêncio mútuo e, agora, dão-se ao olho no olho na mesa de um café.
Concebido em processo colaborativo com os artistas da Cia. Auto-Retrato, o texto de Caetano Gotardo ganha a direção de Marina Tranjan. A temporada começa hoje no décimo andar do Sesc Avenida Paulista.
"Nossa conversa parece um pouco as nossas cartas", diz Clara, personagem interpretada por Marina Corazza. "Às vezes, eu pensava sozinha cartas inteiras para você, como se você ouvisse", diz Silvia (Natacha Dias).
Ambas as personagens, com cerca de 25 anos, elas entabulam diálogo por vezes desconexo. Vão ao passado, na virada do milênio, e, abruptamente, cortam para minutos atrás, quando descem na estação do metrô para o encontro -que também é reencontro. Não fica claro como se conheceram; importa o daqui para frente e o quanto foram afetadas pela estranha amizade feita de distâncias.
Qual papel desempenhar diante da interlocutora sentada em sua frente, com quem dividiu intimidades por correspondência? Tensões e ansiedades passam pela expressão corporal, o gesto de apanhar a xícara de chá, de folhear a revista sem se prender às palavras. A descrição de imprevistos no trajeto entre o metrô e o local.
O desejo dos criadores é dilatar tempo e espaço por meio de lembranças, pequenas e perplexas situações da rotina de cada uma. "Desde o início, a Auto-Retrato pesquisa as relações do homem com o tempo, a memória e o movimento", diz Tranjan sobre o núcleo nascido em 2001 no departamento de artes cênicas da USP.
A temporada em dias alternativos faz parte do projeto Primeiro Sinal, lançado em 2006, em que a unidade do Sesc acolhe grupos emergentes voltados para a experimentação.