São Paulo, quinta-feira, 04 de maio de 2006

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COMIDA

Sabor da Amazônia

Do jambu ao tucupi, festival gastronômico Ver-o-Peso revela originalidade da cozinha do Pará

RACHEL BOTELHO
ENVIADA ESPECIAL A BELÉM

O Brasil não conhece o Brasil. O verso da música "Querelas do Brasil", que Elis Regina tornou célebre, parece ter sido talhado para ilustrar a enorme distância que separa a rica culinária do Pará do restante do país. Na última semana de abril, esse abismo ficou um pouco menor com a realização da sexta edição do festival gastronômico Ver-o-Peso da Cozinha Paraense, realizado em Belém. Uma iniciativa do premiado chef Paulo Martins, do restaurante Lá em Casa, o evento reuniu chefs de vários Estados em torno dos sabores da Amazônia (leia mais no texto à direita).
Berço de uma cozinha genuína, herdada principalmente dos povos indígenas, o Pará guarda mais de 150 espécies de frutas e centenas de variedades de peixes de mar e dos rios que formam a bacia amazônica. "É uma cozinha autóctone, que sofreu muito pouca influência de negros e europeus", afirma Fátima Freitas, professora de cozinha brasileira do Senac.
Também é lá que a mandioca -"a rainha do Brasil", segundo o folclorista Câmara Cascudo- permanece mais presente na dieta da população. "O índio a levou ao extremo: dela faz a farinha, o tucupi, o polvilho, a farinha de tapioca e, das suas folhas, a maniçoba", afirma Martins, embaixador informal da culinária paraense.
Para ele, o tucupi (líquido extraído da mandioca) e o jambu (pequena erva que amortece lábios e língua ao ser mastigada) são os ingredientes mais emblemáticos da região. Com o primeiro, prepara-se o tacacá (sopa servida em cuias, misturada com goma de mandioca, jambu, camarão seco e pimenta-de-cheiro) e receitas com pato, leitão, peixe, camarão e alguns tipos de caça.
O jambu pode ser cozido ou, como mostraram os chefs presentes no evento, preparado em forma de tempurá (fritura envolta em massa leve típica da cozinha japonesa) ou salteado para acompanhar um bacalhau.
O complexo do mercado Ver-o-Peso, estrategicamente posicionado de frente para a baía do Guajará, em Belém, de onde chegam barcos carregados de açaí e outros produtos da floresta, é o melhor lugar para conhecer a diversidade de peixes e frutas regionais.
Entre os primeiros, o filhote é atualmente o mais valorizado e um dos poucos que podem ser encontrados em restaurantes de São Paulo. De carne branca e tenra, com consistência diferente da dos outros peixes de rio, é chamado de piraíba quando adulto.
Há também o tucunaré -firme, preferencialmente assado- e o tambaqui. Gordo, tem sua espinha servida junto da carne, na apreciada costeleta de tambaqui.
O pirarucu, maior peixe de escamas do Brasil, com até 3 m de comprimento, é largamente consumido. Conhecido como bacalhau da Amazônia, é usado seco, fresco ou salgado. Recentemente, passou a ser vendido em algumas lojas do Pão de Açúcar em SP.
Na seara das frutas, nomes sonoros como bacuri, sapotilha, pupunha, uxi, jatobá, taperebá e tucumã permanecem praticamente desconhecidos fora da região Norte, representada basicamente pelo açaí e cupuaçu em outros recantos. No Mercado Municipal de São Paulo, melhor local para encontrar algumas delas, a distribuição ainda é irregular.
O açaí é outro ingrediente fundamental da dieta paraense. Fruto de uma palmeira abundante na Amazônia, seu suco é consumido em diversas partes do Brasil misturado a frutas e cereais. Lá, entra nas refeições misturado à farinha d'água para acompanhar peixes e carnes, mas também é apreciado com açúcar a qualquer hora.


A jornalista Rachel Botelho viajou a convite do festival Ver-o-Peso da Cozinha Paraense


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