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COMIDA
Sabor da Amazônia
Do jambu ao tucupi, festival gastronômico Ver-o-Peso revela originalidade da cozinha do Pará
RACHEL BOTELHO
ENVIADA ESPECIAL A BELÉM
O Brasil não conhece o Brasil. O
verso da música "Querelas do
Brasil", que Elis Regina tornou célebre, parece ter sido talhado para
ilustrar a enorme distância que
separa a rica culinária do Pará do
restante do país.
Na última semana de abril, esse
abismo ficou um pouco menor
com a realização da sexta edição
do festival gastronômico Ver-o-Peso da Cozinha Paraense, realizado em Belém. Uma iniciativa do
premiado chef Paulo Martins, do
restaurante Lá em Casa, o evento
reuniu chefs de vários Estados em
torno dos sabores da Amazônia
(leia mais no texto à direita).
Berço de uma cozinha genuína,
herdada principalmente dos povos indígenas, o Pará guarda mais
de 150 espécies de frutas e centenas de variedades de peixes de
mar e dos rios que formam a bacia
amazônica. "É uma cozinha autóctone, que sofreu muito pouca
influência de negros e europeus",
afirma Fátima Freitas, professora
de cozinha brasileira do Senac.
Também é lá que a mandioca
-"a rainha do Brasil", segundo o
folclorista Câmara Cascudo-
permanece mais presente na dieta
da população. "O índio a levou ao
extremo: dela faz a farinha, o tucupi, o polvilho, a farinha de tapioca e, das suas folhas, a maniçoba", afirma Martins, embaixador
informal da culinária paraense.
Para ele, o tucupi (líquido extraído da mandioca) e o jambu
(pequena erva que amortece lábios e língua ao ser mastigada)
são os ingredientes mais emblemáticos da região. Com o primeiro, prepara-se o tacacá (sopa servida em cuias, misturada com goma de mandioca, jambu, camarão
seco e pimenta-de-cheiro) e receitas com pato, leitão, peixe, camarão e alguns tipos de caça.
O jambu pode ser cozido ou, como mostraram os chefs presentes
no evento, preparado em forma
de tempurá (fritura envolta em
massa leve típica da cozinha japonesa) ou salteado para acompanhar um bacalhau.
O complexo do mercado Ver-o-Peso, estrategicamente posicionado de frente para a baía do Guajará, em Belém, de onde chegam
barcos carregados de açaí e outros
produtos da floresta, é o melhor
lugar para conhecer a diversidade
de peixes e frutas regionais.
Entre os primeiros, o filhote é
atualmente o mais valorizado e
um dos poucos que podem ser
encontrados em restaurantes de
São Paulo. De carne branca e
tenra, com consistência diferente
da dos outros peixes de rio, é chamado de piraíba quando adulto.
Há também o tucunaré -firme, preferencialmente assado-
e o tambaqui. Gordo, tem sua espinha servida junto da carne, na
apreciada costeleta de tambaqui.
O pirarucu, maior peixe de escamas do Brasil, com até 3 m de
comprimento, é largamente consumido. Conhecido como bacalhau da Amazônia, é usado seco,
fresco ou salgado. Recentemente,
passou a ser vendido em algumas
lojas do Pão de Açúcar em SP.
Na seara das frutas, nomes sonoros como bacuri, sapotilha, pupunha, uxi, jatobá, taperebá e tucumã permanecem praticamente
desconhecidos fora da região
Norte, representada basicamente
pelo açaí e cupuaçu em outros recantos. No Mercado Municipal de
São Paulo, melhor local para encontrar algumas delas, a distribuição ainda é irregular.
O açaí é outro ingrediente fundamental da dieta paraense. Fruto
de uma palmeira abundante na
Amazônia, seu suco é consumido
em diversas partes do Brasil misturado a frutas e cereais. Lá, entra
nas refeições misturado à farinha
d'água para acompanhar peixes e
carnes, mas também é apreciado
com açúcar a qualquer hora.
A jornalista Rachel Botelho viajou a
convite do festival Ver-o-Peso da
Cozinha Paraense
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