São Paulo, quinta-feira, 04 de outubro de 2001

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RELÂMPAGOS

Ópera zonza

João Gilberto Noll

Entrei pelos corredores do conservatório, no ar uma soprano radiosa. Fugia de alguém. Tranquei-me na privada. Ouvi passos no lado de fora. Só podia ser o tal atrás de mim. Sentei no vaso, baixei a calça, porque, se ele se agachasse, veria apenas os pés de um corpo em sua rotina animal. Ele queria me carregar para um servicinho na fronteira com o Uruguai. Bateram na porta. Em disparatado disfarce, gemi como se estivesse em plena azáfama solitária. Já estava de fato entrando nela; no clímax, bufei, enquanto a Rainha da Noite surtava em seus gorjeios. O cara arrombou a porta já em meio a ecos de uma ovação. De súbito, a platéia emudece. Saciada ou não? O certo é que, ali, é dele o poder. Eu me abotôo como súdito desse solo cavernoso de Sarastro.


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