São Paulo, quarta-feira, 04 de dezembro de 2002

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TEATRO

Pré-estréia da primeira parte da trilogia, "A Terra", marcou centenário do livro de Euclydes da Cunha na segunda

Oficina mostra seu vôo panorâmico sobre "Os Sertões"

VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

No final da tarde de segunda-feira, cerca de 350 pessoas preencheram a capacidade do Oficina, no Bixiga paulistano, e viram como o dramaturgo, encenador e ator José Celso Martinez Corrêa e o grupo Oficina Uzyna Uzona conseguiram teatralizar rochas, plantas, rios, desertos e outros fenômenos da natureza transformados em personagens de uma peça-coral, assim como o engenheiro-escritor fluminense Euclydes da Cunha (1866-1909) e o líder religioso cearense Antônio Conselheiro (1830-97).
Apesar do horário de verão, o sol não desceu na pré-estréia que ocorreu na histórica data do centenário de lançamento do livro, a 2 de dezembro de 1902.
Garoou, mas nada que impedisse a abertura do teto-móvel. E o palco-corredor foi preenchido por vários caminhões de terra, simbolizando o chão semi-árido do sertão.
Norte, sul, leste, oeste, subterrâneo e céu. O espaço retangular do Oficina é esquadrinhado em todas as suas possibilidades, assim como Euclydes o faz na meticulosa descrição geológica, geográfica e climática do planalto central brasileiro em "A Terra", a primeira parte de "Os Sertões", cuja trilogia épica será completada pelo grupo em 2003 ("O Homem" e "A Luta").
A montagem começa com os cerca de 40 atores, a maioria vestida de branco, saindo para a rua Jaceguai, de encontro ao público, e depois retornando ao teatro vazio, preenchendo-o com gestos e passos lentos, em silêncio.
"No início era a cantata", eis o mote de origem para os ritmos que pontuam a encenação: samba, baião, tango, funk, rap etc.
Surge a metáfora de um vôo panorâmico sobre Canudos, na Bahia. "Fiquei emocionada com o vôo de pássaro do coro [atores concentrados num dos pontos altos da estrutura metálica do teatro". O olhar o mundo de cima, recurso estilístico do século 19, como faz Euclydes no início do livro", afirma a designer e jornalista Márcia Zoladz, 47, viúva do pesquisador e professor da USP Roberto Ventura (1957-2002), autor de "Folha Explica "Os Sertões'", lançado na ocasião.
Zé Celso, 65, concebe "A Terra" como um teatro pré-grego, uma tragédia iminente, por exemplo, no conflito secular entre os mares e a terra.
"No uso do espaço e nas falas, Zé Celso faz uma construção original da tragédia grega, uma percepção euclydiana da terra, uma compreensão precisa do cenário da guerra que virá", diz Zoladz, acompanhada do filho Tomas.
Também estiveram na sessão de anteontem o senador Eduardo Suplicy (PT), a professora de literatura da USP Walnice Nogueira Galvão, a diretora Monique Gardenberg, a atriz Bete Coelho (que interpretou Cacilda no mesmo teatro) e o ex-jogador Raí, diretor da Fundação Gol de Letra, da qual alguns adolescentes participaram da peça ao lado de crianças do projeto Bixigão, este acolhido pelo próprio Oficina.


OS SERTÕES - A TERRA. De: Euclydes da Cunha. Adaptação e direção: José Celso Martinez Corrêa. Com: grupo Oficina Uzyna Uzona (Aury Porto, Camila Mota, Fioravante Almeida, Flávio Rocha, Fransérgio Araújo, Letícia Coura, Luciana Domschke, Marcelo Drummond, Pedro Epifânio, Ricardo Bittencourt, Sylvia Prado e outros). Onde: teatro Oficina (r. Jaceguai, 520, tel. 0/xx/11/3106-2818). Quando: estréia 7/12, às 18h; sáb. e dom., às 18h. Quanto: R$ 30. Até 23/12 (sessão especial dia 23/12, às 14h30; R$ 10). Na internet: www.teatroficina.com.br


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