São Paulo, segunda-feira, 05 de janeiro de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

O texto abaixo contém um Erramos, clique aqui para conferir a correção na versão eletrônica da Folha de S.Paulo.

Crítica/DVD/"Clara Nunes"

Clipes raros relembram época em que Clara Nunes interpretava sambas na TV

LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO

Antes de poder encantar, o primeiro DVD a reunir números musicais de Clara Nunes espanta: são 21 clipes gravados para o programa "Fantástico", da TV Globo, num período de apenas nove anos (1974-1983). E ainda havia mais três, descartados para evitar problemas de autorização.
Relembrada hoje, a assiduidade da cantora no programa dominical tem um lado muito bom: Clara aparecia interpretando só aquilo em que realmente acreditava, sem fazer concessões, contracenando diversas vezes com representações de orixás, imagem nada oficial na ditadura militar.
E tem um lado ruim: com tantas participações, devia ser difícil manter elevado o nível dos clipes, e a qualidade de alguns acabava sendo de fato sofrível, até por causa da precariedade tecnológica. As alusões ao candomblé estão explícitas ou discretas em "Conto de Areia", "É Doce Morrer no Mar", "A Deusa dos Orixás", "O Mar Serenou", "Guerreira", "Banho de Manjericão", "Nação" e "Ijexá (Filhos de Gandhi)". A Clara de vestido branco, colares, cabelos soltos, mexendo os braços e girando de modo ritualístico é a que ficou no imaginário popular.
Certamente, essas aparições no "Fantástico" contribuíram muito para isso.

Visual irregular
A Clara que se tornou sinônimo de cantora de samba também está em outros momentos do DVD, nos quais, aliás, o bom gosto visual oscila.
Em "Macunaíma", o samba-enredo de 1975 da Portela, a cantora surge de rosa diante de um fundo azul naïf, num conjunto nada feliz. Já "Portela na Avenida" é emocionante, pois foi gravado na quadra da escola com a participação de bateria (Mestre Marçal à frente), pastoras e componentes.
Na maioria das vezes, Clara cantava em playback. E, em algumas delas, com o fundo em "chroma-key" (uma imagem aplicada simulando um cenário). O resultado podia ser bastante artificial, como na sincronização imperfeita de "Feira de Mangaio" ou no halo em torno do cabelo da artista em "Viola de Penedo".
Vale, então, saborear um momento "ao vivo" como "À Flor da Pele", que ainda prova a grande intérprete romântica que Clara conseguia ser.
E vale perceber como a televisão avançava na época e tornava as produções cada vez mais caprichadas. Ela nas Sete Quedas em "Guerreira" (1978), num canavial em "Morena de Angola" (1980) e usufruindo de tomadas aéreas na fraca "Como É Grande e Bonita a Natureza" (1982) são alguns exemplos de tacadas ambiciosas.
A morte precoce de Clara em 1983, aos 39 anos de idade, impediu que a cantora pudesse arriscar ainda mais. Mas o DVD mostra que ela fez bastante enquanto pôde.

CLARA NUNES
Gravadora: EMI
Quanto: R$ 40, em média
Avaliação: bom
Classificação indicativa: livre



Texto Anterior: Crítica/"Boy", "October", "War": U2 já anunciava pop, política e ego
Próximo Texto: "O surrealismo me atrai por sua liberdade plena"
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.