Temperada por humor negro, HQ é protagonizada por anti-herói em uma história em que Deus é o vilão

PEDRO CIRNE
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Há um segredo milenar que envolve o herdeiro de Jesus Cristo, uma poderosa organização internacional e um homem implicado por acaso no meio de tudo. E você não está lendo "O Código da Vinci", mas a história em quadrinhos "Preacher", cujo terceiro volume foi lançado neste mês no Brasil.
As semelhanças entre o romance de Dan Brown e a HQ dos britânicos Garth Ennis (roteiro) e Steve Dillon (arte) acabam aí. "Preacher" é uma história de extrema violência, humor negro, cenas de sadismo e que -apesar dessas características, ou justamente por elas-, fez muito sucesso nos Estados Unidos.
"Preacher" foi publicado nos EUA de 1995 a 2000: foram 66 números mensais e seis edições especiais, formando não por acaso o número 666. O anti-herói da série é Jesse Custer, um pastor (em inglês, "preacher"), e o vilão é... Deus.
Na história, Deus abandonou o céu por motivos desconhecidos. Custer descobre isso e resolve ir atrás de Deus para "tirar satisfações".
Se ele fosse, de fato, apenas um pastor, não teria chance nenhuma. Mas Custer recebeu um poder que o torna o homem mais poderoso da Terra: uma voz que faz com que ele seja sempre obedecido.
Se ele disser "pule", "largue a arma" ou qualquer outra ação, quem ouvir não terá opção. Mesmo se Jesse Custer der ordens mais fortes como "queime" ou "morra", o resultado é inevitável.
"Preacher" é narrada em ritmo de história de super-heróis. Há seres poderosos (ainda que sem uniformes), traições, mistérios, reviravoltas. E tem dois trunfos: os diálogos escritos por Ennis e a narração dinâmica da dupla Ennis-Dillon, que consegue impor um ritmo de ação incessante.
Esta não é a primeira vez que "Preacher" sai no Brasil. Quatro editoras publicaram a série de 1997 a 2004, quando foi interrompida a seis capítulos do final. A Devir optou por relançar as histórias a partir do número um, agora reunidas em livros, e não em edições avulsas, como as editoras anteriores.
Este volume, "Orgulho Americano", é o terceiro, e reúne as histórias publicadas originalmente do número 18 ao 26. Jesse Custer não é um "herói" normal: passional, violento, impulsivo, bem distante do pastor que um dia ele tentou ser. O Deus que ele quer enfrentar também é diferente: cruel, mimado, quase infantil.
"Preacher" não é uma série previsível, e esta talvez seja a sua maior virtude.