São Paulo, sábado, 05 de março de 2005

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EXPOSIÇÃO

Com curadoria de Vik Muniz, mostra com obras do fotógrafo norte-americano evita sua faceta mais conhecida

Mapplethorpe volta com olhar renovado

EDER CHIODETTO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Robert Mapplethorpe, o fotógrafo que expôs as feridas da moralidade e da intolerância da sociedade americana ao retratar a sexualidade homoerótica dos guetos nova-iorquinos, está de volta. Oito anos após uma grande retrospectiva realizada no MAM (Museu de Arte Moderna), o herói trágico, que morreu em decorrência da aids em 1989, retorna a São Paulo, na galeria Fortes Vilaça, sob curadoria do artista plástico brasileiro Vik Muniz.
O recorte da obra de Mapplethorpe proposto por Muniz surpreende. Não há nenhuma fotografia de nu masculino ou de flores, temas que celebrizaram para o bem e para o mal a obra do norte-americano.
"Mapplethorpe virou um ícone, e ícones não têm profundidade. Os nus e as flores coloram-no em evidência, mas também diluíram o restante de seu trabalho. Para o público, ele virou um artista facilmente reconhecível, e isso o empobrece, soa a uma música que toca repetidamente numa jukebox", conta Muniz.
A operação para tirar Mapplethorpe da jukebox foi precedida por uma pesquisa em todo o arquivo do artista, que gerou um conjunto de 50 fotografias em que predominam os portraits de amigos e artistas, bem como imagens pouco conhecidas de interiores.
"Não acho que a discussão que ele trouxe à tona, marcada pelo enfrentamento à intolerância e pela não-aceitação da diferença, esteja ultrapassada. Pelo contrário, ela se faz urgente e importante no contexto atual, marcado pelo retorno de um falso moralismo. No entanto, optei por uma revisão que valorizasse sua obra no contexto da história da arte."
O rigor formal no uso do preto-e-branco e a clara obsessão pelas composições simétricas revelam, segundo Muniz, o apreço que o fotógrafo tinha pela fotografia do século 19, além de remeter claramente à educação religiosa que ele teve na infância. "As simetrias de suas fotos lembram altares de igrejas", diz.
Em 1988, Mapplethorpe dizia: "Não gosto da palavra "chocante". Busco o inesperado, coisas que nunca vi... Tive a chance de tirar essas fotos. Senti-me na obrigação de tirá-las". Tal fala encontra ressonância em Muniz: "Não gosto de sensacionalismo, de foto chocante. Elas induzem a uma leitura rápida, é um signo facilmente devorado. Prefiro imagens que convidem à contemplação".
A presente mostra em São Paulo é, dessa forma, uma operação antichoque na obra do fotógrafo. Longe de se tornar uma assepsia na incendiária iconografia, tal revisão estabelece um diálogo generoso entre dois artistas que resulta num recorte que faz emergir um Mapplethorpe igualmente compulsivo e contundente, porém, mais silencioso e sutil.


Robert Mapplethorpe
   
Onde: Fortes Vilaça (r. Fradique Coutinho, 1.500, SP, tel. 0/xx/11/3032-7066)
Quando: ter. a sex.: 10h às 19h; sáb.: 10h às 17h. Até 9/4
Quanto: entrada franca


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