São Paulo, quarta-feira, 05 de abril de 2006

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MÚSICA

"Prefiro comer meus testículos (e eu sou vegetariano) a voltar com a banda", diz cantor

Morrissey lança oitavo CD solo e nega volta dos Smiths

Ethan Miller - 17.abr.2004/Reuters
Antes do CD, Morrissey havia lançado um single no site MySpace


LÚCIO RIBEIRO
COLUNISTA DA FOLHA

O "maior ser britânico inglês vivo hoje" agora é também o "novo imperador romano". Para um senhor de 46 anos, o cantor inglês Morrissey está em pleno gás.
"Acusado" de um dia ter fundado os Smiths e de ter salvo milhares de jovens tristes, miseráveis e incompreendidos (como ele se autoproclamava) que viviam trancados em seus quartos cinzentos, Morrissey voltou ao pop nesta semana com o triunfante e oitavo CD solo, "Ringleader of the Tormentors", gravado na Itália, para onde se mudou.
"Nesta semana" é modo de dizer. O disco ganhou lançamento físico nos EUA e na Europa há apenas alguns dias, mas, moderno, Morrissey já havia lançado seu primeiro single, "You Have Killed Me", no site MySpace (www.myspace.com/morrissey).
Independente (leia-se sem grande gravadora por trás), foi à vitrine do festival americano South by Southwest, no Texas, mostrar ao vivo suas novas músicas e praticamente roubou a cena no evento de 1.400 bandas.
Um famoso "boca grande" do rock, suas entrevistas, suas opiniões sobre tudo e todos vêm ganhando manchetes na imprensa musical desde que 2006 começou. Cansado de Bush e da "falsa democracia" americana, foi morar em Roma atrás de felicidade, amor e luxúria, segundo ele. Botou sua língua ferina a desancar personagens britânicos como o premiê Tony Blair, o jogador David Beckham e a modelo Kate Moss. Atacou o sucesso repentino da banda inglesa Arctic Monkeys, arrumou briga com o astro Noel Gallagher (Oasis) por isso e pediu desculpa para os meninos.
"O que aconteceu com eles foi exatamente o que aconteceu com os Smiths. Eu realmente deveria calar essa minha boca", disse à imprensa do Reino Unido.
A boca de Morrissey, semanas antes, durante conferência no South by Southwest, havia dito que ele havia recusado uma oferta de US$ 5 milhões (mais de R$ 10 milhões) para reformar os Smiths e tocar em apenas um show no festival californiano Coachella, no final de abril. A platéia que lotava o auditório coletivamente engoliu a seco com o assunto da possível volta da mítica banda dos anos 80.
"Não é uma questão de dinheiro. Hoje eu preferiria comer meus próprios testículos a voltar com os Smiths. E olha que eu sou vegetariano...", falou, para uma seqüência de "oohs" no auditório.
"Os Smiths foram uma viagem fantástica. E então acabou. E na época eu não achava que deveria acabar. Eu queria continuar. Mas ele [o guitarrista Johnny Marr] quis terminar. Já faz 18 anos. Eu não conheço mais eles, eles não me conhecem mais. Eles não sabem mais nada sobre mim. Eu não sei mais nada sobre eles. O pouco que eu sei sobre eles é bem desagradável. Então por que nós iríamos querer estar juntos no mesmo palco, fazendo música?"
"Ringleader of the Tormentors" tem um futuro nebuloso no Brasil. Lançado lá fora pelas pequenas Attack (Inglaterra) e Sanctuary (EUA), o disco, em edição nacional, acaba de ir por questões contratuais das mãos da Sony/ BMG às da Universal, que não tem idéia de quando vai botar os CDs nas lojas. Nada está programado para este ano. É uma pena, porque o álbum novo de Morrissey é de emocionar, dos velhos fãs dos Smiths à nova garotada emo, atrás de fortes letras tristes.
O cantor ainda carrega o brilho vocal e único que lhe deu fama. Sua voz e sua performance no palco estão longe de mostrar algum sinal da corrosão da idade, que infelizmente afeta a grande maioria dos cantores/bandas veteranos que voltam à ativa ou ainda insistem em não acabar.
Morrissey foi fundo nas novas canções a respeito de Deus, morte e amor. Se no álbum anterior, "You Are the Quarry" (2004), ele havia perdoado Jesus ("I Have Forgiven Jesus"), neste ele pede ajuda de Deus na balada "quase-brega" "Dear God Please Help Me". O papo dele com Ele ocorre nas ruas de Roma, com o cantor vagando e divagando sobre um certo amor, cansado de ser punido por "ter feito as coisas certas".
"Ringleader of the Tormentors" foi gravado no Forum Music Village de Tony Visconti (produtor de David Bowie) e tem cordas de Ennio Morricone em "Dear God Please Help Me". Morrissey, ou agora "Il Mozalini", fez um perfeito "Italian job".


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