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CDS
MPB
"Baladas do Asfalto e Outros Blues" incorpora Murilo Mendes e Roberto Carlos
Zeca Baleiro conjuga clima amargo e astral "radiofônico"
DA SUCURSAL DO RIO
Zeca Baleiro já desejava há
muito tempo gravar sua versão para o poema "Mulher Amada", de Murilo Mendes. Mas nunca via a música encaixando-se nas
idéias dos discos. No quinto CD
solo, o agora lançado "Baladas do
Asfalto e Outros Blues", a faixa
entrou à força.
"Também não encaixava, mas
resolvi pôr para criar um estranhamento mesmo", explica Baleiro, 39, rindo de sua opção.
O caso serve para falar do novo
trabalho do cantor e compositor
maranhense e, também, do trabalho dele em geral. "Mulher Amada" é o ponto de inflexão do CD,
onde ele deixa de ser basicamente
pop, folk ou "radiofônico" -adjetivo dele, talvez melhor do que
os outros- e se torna mais amargo. Aliás, chama-se "Amargo"
uma das seis faixas finais.
"Há [no CD] momentos solares
e outros mais melancólicos. A
tristeza é sempre bem-vinda. Mas
esse disco não foi realizado sob
efeito de nenhuma situação pessoal específica", diz Baleiro.
O CD começou a ser gerado no
segundo semestre de 2004, quando sua dupla de produtores Walter Costa e Dunga lhe pediu três
canções para fazer experiências
de arranjo. Ao ouvi-las, Baleiro
descobriu o tal clima radiofônico
que resolveu imprimir em boa
parte do disco.
"É pelo menos o rádio que eu tenho na minha cabeça. Talvez fosse o rádio que a gente quisesse que
existisse", justifica ele, indicando
uma receita pop que não seja sinônimo de demência.
Mas aquela história inicial também serve para dizer que, segundo Baleiro, não é um conceito
prévio o que embasa seus discos.
Ele diz ver mais "filosofia em Nelson Cavaquinho do que em Michel Foucault".
"O conceito vem depois. Desde
que surgiu esse negócio de conceito, piorou muito a música.
Muitas vezes o discurso do conceito é uma máscara para disfarçar a inconsistência do trabalho.
Eu prefiro ir para o estúdio na base do "vamos ver no que vai dar'",
diz ele.
No caso de "Baladas do Asfalto e
Outros Blues", deu em um disco
que ganha mais força quando
perde em voltagem. Nas sete primeiras faixas, o compositor mescla rock, reggae, Jorge Ben Jor e
outras referências suas para embasar jogos de palavras irregulares. "Balada do Asfalto" ("Mesmo
o mais sozinho nunca fica só/
Sempre haverá um idiota ao redor") é a melhor do bloco.
"Eu acho que a metáfora do asfalto sintetiza muita coisa, de bom
e de ruim. Significa o estrangulamento do homem moderno e os
novos caminhos que as estradas
abrem", explica ele, que prefere
São Paulo ao Rio de Janeiro.
"São Luís já era uma cidade
praieira. Saí de lá porque queria o
concreto, a agitação. Não sou contemplativo. Aqui no Rio não conseguiria trabalhar tanto", diz ele,
tendo ao fundo o Pão de Açúcar e
a enseada de Botafogo.
No segundo bloco do CD, além
da belíssima versão para o poema
de Murilo Mendes, ele homenageia Roberto Carlos em um par de
boas canções, "radiofônicas",
mas bastante poéticas. Em "Cigarro", ele cita a clássica "Por Isso
Corro Demais", e em "Muzak" fala da inevitável diluição da arte
pela indústria cultural.
"Roberto e Erasmo são nossos
[John] Lennon e [Paul] McCartney. Criaram um vocabulário que
influencia a todos. De José Miguel
Wisnik a Wando, de Caetano Veloso a Odair José. Mesmo com essas musiquinhas que faz hoje, Roberto continua grande", exalta.
Significativamente, depois de
dialogar tanto com o mundo pop,
Baleiro encerra o CD com uma
ótima música chamada "O Silêncio", em que canta: "Agora só me
falta aprender/ O silêncio".
Ainda em agosto, Baleiro promete lançar mais CDs, mas não
seus. Devem sair no fim do mês o
disco que fez a partir de poemas
de Hilda Hilst, com participação
de dez cantoras, e o de inéditas de
Sérgio Sampaio (de "Eu Quero
Botar Meu Bloco na Rua"), que
produziu a pedido da família do
compositor.
(LFV)
Baladas do Asfalto e Outros Blues
Artista: Zeca Baleiro
Gravadora: MZA
Quanto: R$ 30, em média
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