|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
4ª FESTA LITERÁRIA INTERNACIONAL DE PARATI
Foer revê o 11/9 pelos olhos de uma criança
Uma das estrelas da Flip, escritor
americano lança seu segundo romance
Best-seller aos 25 anos, autor, que já teve obra adaptada para o cinema, diz que o debate sobre os atentados têm evoluído
MARCOS STRECKER
DA REPORTAGEM LOCAL
Uma das estrelas da Flip, Jonathan Safran Foer ganhou a
fama de "menino prodígio" em
2002, aos 25 anos, quando seu
primeiro livro, "Tudo se Ilumina", virou best-seller e recebeu
diversos prêmios, como o
Guardian First Book Award.
Com humor, irreverência e alguma ousadia formal, o livro
contava a história do próprio
autor quando buscou as raízes
familiares na Ucrânia.
O escritor está lançando seu
segundo livro, "Extremamente
Alto & Incrivelmente Perto",
em que um menino de nove
anos procura pela cidade de
Nova York a memória emocional de seu pai, morto nos ataques do 11 de Setembro.
Foer vem para Parati com a
mulher, Nicole Krauss, escritora que também ganha prestígio
crescente. Em entrevista, ele
diz que os EUA sempre estiveram abertos a discutir os atentados, afirma que não liga para
a crítica e relata suas impressões sobre São Paulo, cidade
que já visitou e que abriga parte
de sua família.
FOLHA - Passados quase cinco anos
do 11 de Setembro, o cinema e o
mercado editorial nos EUA parecem
estar mais à vontade para abordar o
assunto. Você concorda?
JONATHAN SAFRAN FOER - Sempre
estivemos prontos para debater o assunto. No começo, a discussão soou como medo, raiva.
Então se tornou mais uma conversa sobre luto, talvez. Daí se
tornou mais política. Esse debate nunca se encerrará. Sempre haverá novos sentimentos
envolvidos. Como americano,
pessoalmente, é interessante
ver como todo o debate tem
mudado. Acho que meu livro é
uma parte dessa conversa.
FOLHA - Seus dois livros lidam com
a memória. Por que esse tema?
FOER - Não sei se é tão pessoal
para mim. Talvez tenha a ver
com a minha família. A história
tirou muito da minha família.
Sendo judeu, você é encorajado
a buscar a memória de uma forma muito específica. E, diferentemente das gerações passadas, a memória na minha geração é muito "externa". Ninguém se lembra dos números
dos telefones, porque eles já ficam guardados nos celulares.
Não precisamos lembrar datas
porque temos organizadores
eletrônicos. Temos o Google.
Não precisamos "interiorizar"
as informações. Mas acho que
isso também pode criar um tipo
de relação com o mundo, um
sentimento de solidão e deslocamento. Vários escritores da
minha geração tendem a escrever sobre a memória.
FOLHA - Seu último livro é muito
visual. Qual sua relação com artes
visuais ou com HQ?
FOER - Gosto de HQ e costumo
ler. Mas acho que não me influencia tanto quanto as minhas leituras ou quanto as artes
visuais. Um amigo diz que todo
escritor tem a fantasia secreta
de ser artista. E todo artista
tem a fantasia secreta de ser escritor. Sendo escritor, você
sempre está tentando se explicar. Como artista, você só deseja fazer sentido, criando uma
atmosfera e um sentimento,
em vez de contar uma história.
FOLHA - De certa forma "Extremamente Alto & Incrivelmente Perto"
lembra a "Trilogia de Nova York", de
Paul Auster, ou o universo de Borges. Eles influenciaram você?
FOER - Bem, vivo na mesma rua
em que Paul Auster mora
[Brooklyn, em Nova York], mudei-me para cá em boa parte
por causa dele. Gosto dele e leio
sua obra, mas acho que escrevemos de forma muito diferente. Adoro Borges. Acho que
meus livros têm mais relação
com ele. Ele tem um tipo de
imaginação que eu adoro.
FOLHA - O personagem de seu livro
chama-se Oskar. Tem alguma relação com o personagem de "O Tambor", de Günter Grass?
FOER - Sim, tem... Adoro esse livro. Os dois são crianças, observam o que os adultos fazem. Até
certo ponto rejeitam o que os
adultos fazem... Mas o Oskar de
Grass se recusa a ficar adulto. O
meu não, ele se joga no mundo,
em vez de receber dele.
FOLHA - Você foi elogiado por escritores como Salman Rushdie e
John Updike e já chegou a ser chamado de "genial" pelo jornal "The
Times". Também já foi muito criticado. Como você reage à crítica?
FOER - Prefiro quando me chamam de idiota... Não levo em
conta o que a crítica diz, em
parte porque não tenho como
objetivo escrever um grande
romance, no sentido do que os
críticos gostam. Tenho o objetivo de fazer algo mais pessoal.
Faço coisas sem pensar nas
idéias por trás. Nunca refleti se
faço realismo mágico ou sátira,
paródia ou literatura judaica.
FOLHA - Você gostou da versão de
Liev Schreiber para "Tudo se Ilumina" ["Uma Vida Iluminada"]?
FOER - De muitas coisas eu gosto, de outras não. Evito falar sobre o filme, fiquei amigo dele.
Bem, é minha resposta oficial...
FOLHA - Você se considera um autor "independente"?
FOER - Não me encaro como
escritor. Não vou a festas, não
tenho nenhum interesse particular em conhecer outros escritores. Não sei de nada sobre o
mundo editorial. Meu objetivo
nunca foi ser escritor. Quero
expressar algo que valha a pena, que seja essencial para mim,
necessário. Até agora a maior
parte desse trabalho se expressou na forma de livros. Talvez
nem continue assim. Meu último livro é bastante visual.
FOLHA - Você tem uma biografia
muito diversificada. É verdade que
já trabalhou numa joalheria?
FOER - Meu avô tinha uma joalheria, trabalhei lá um verão. É
divertido convencer as pessoas
a comprar algo de que elas absolutamente não precisam.
Diamantes são como uma obra
de ficção. Não há nada de intrinsecamente valioso neles,
você cria uma história que os
torna valiosos. Trabalhar numa
joalheria e escrever romances
são coisas similares...
FOLHA - Seu irmão, Franklin Foer
[editor da revista "New Republic"],
escreveu o livro "Como o Futebol Explica o Mundo". Você também gosta do esporte?
FOER - Sim, acompanhei a Copa, torci para o Brasil, como
meu irmão. Metade da minha
família mora em São Paulo. Já
estive duas vezes na cidade, é
um lugar incrível. Há tantas
coisas que você deseja ver. E
tantas de que quer desviar o
olhar. Fico com minha família,
não tenho uma visão de turista.
Tenho uma visão especial.
Texto Anterior: Flip ou flop? Próximo Texto: Mônica Bergamo Índice
|