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MÚSICA
Atração de amanhã do evento no Jockey Club, saxofonista critica pop e promete "beleza triste"
Marsalis traz "velhice" a festival teen
CASSIANO ELEK MACHADO
DA REPORTAGEM LOCAL
O Tim Festival começa hoje sua
segunda edição com mais sabor
de playground do que de casa de
repouso. Mas em meio a molecadas, como as das bandas Libertines, Kinky ou Cansei de Ser Sexy,
o programa do festival inclui tigrões do pop, como Brian Wilson
e Kraftwerk, e velhas guardas do
jazz, casos de Art van Damme, 84,
e de Nancy Wilson, 67, que disse à
Folha que hoje poderia ser o último show de sua vida.
De todas as atrações do evento
do Jockey Club, porém, ninguém
é mais velho do que um jovem de
44 anos. Branford Marsalis, primogênito da família real do jazz
(o pianista Ellis é pai, além dele,
dos jazzistas Wynton, Delfeayo e
Jason), surgiu nos anos 80 na geração batizada de "young lions".
O saxofonista, que se apresenta
amanhã no Tim, se define hoje
como um "old lion". Em entrevista à Folha, diz que está buscando
no seu jazz a beleza triste da canção erudita alemã, critica a música pop (e ele já tocou com Sting) e
se mostra melancólico com a
constatação de que "metade da vida ficou para trás". Leia a seguir
trechos da conversa com o "leão
velho", na cova dos leõezinhos.
Folha - O sr. já disse que costumava ouvir todos os dias "A Love Supreme", de John Coltrane, antes de
trabalhar. O sr. ainda faz isso?
Branford Marsalis - Gostava de
ouvir "Love Supreme" antes de
dormir. Não consigo mais. Estou
muito velho. Não consigo ouvir
mais esse tipo de música na hora
do sono. Fico muito aceso.
Folha - E quais são suas "canções
de ninar" hoje em dia?
Marsalis - Tenho escutado "lieder" (canções de câmara alemãs)
de Wagner, Mahler e Strauss.
Folha - Como isso se reflete no
seu modo de tocar hoje em dia?
Marsalis - Acho que isso aparece
no desafio que venho colocando
para mim de tocar de um modo
bonito, mas triste. As canções alemãs desses compositores eruditos
são assim. Têm melodias muito
bonitas, que precisam de uma dose de tristeza para ser entendidas.
Folha - O sr. chegou a se aproximar do pop, tocando com Sting ou
no programa de Jay Leno. Hoje o sr.
parece mais ortodoxamente jazzista. O sr. mudou ou foi o pop?
Marsalis - Sempre fui um jazzista
ortodoxo. Mesmo quando toquei
com Sting estava tocando jazz.
Quando tinha minha banda funk
Buckshot LeFonque eu tocava
jazz. O pop não é para pessoas
mais velhas. É muito interessante
ver pessoas da minha idade ou
mais velhas que continuam fiéis
ao pop, e só a ele, homens de 50 ou
mais tentando se agarrar a seus
Stones, Bob Dylans ou Eagles. Os
chamados filhos do "baby boom"
têm medo de ficarem adultos.
Não faço parte disso. Tenho 44
anos, dois filhos, um a caminho.
Folha - Mas o sr. teve relações fortes com gêneros como o hip hop,
antes de ele estourar nos EUA.
Marsalis - Eu era um jovem, isso
é coisa do passado. Não ouço quase nada de pop. Gosto de uma ou
outra coisa, do DJ Premiere, de
Andre 3000 [da dupla Outkast].
Mas são coisas que meu filho escuta. Alguém com minha responsabilidade, que já se deu conta de
que metade de minha vida ficou
pra trás, não tem como se sintonizar com o lirismo do pop. Não me
sinto "forever young".
Folha - O sr. não é mais um
"young lion" então?
Marsalis - Não, sou "old lion".
Folha - O sr. e seu irmão Wynton
tiveram longas carreiras na gigantesca Columbia. No ano passado, os
dois romperam com essa gravadora. O sr. montou um pequeno selo.
Este é o futuro do jazz?
Marsalis - Não sei. Quando entrei na Columbia, ela era parte do
conglomerado CBS. O selo de
música era uma parte pequena no
negócio, não havia muita pressão.
Hoje é parte da Sony, existe uma
cobrança muito grande para fazer
dinheiro. Assim, todo tipo de música criativa fica sufocado.
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