|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
"OS ESQUECIDOS"
Jogo conspiratório é manipulado com pouco brilho por Joseph Ruben
CLAUDIO SZYNKIER
FREE-LANCE PARA A FOLHA
A arquitetura de "Os Esquecidos" é baseada em planos aéreos. Ou seja, gente que está
em cima olha aqui para baixo. É o
observador invisível, que domina
panorama e ações. E é bom saber
que estamos em um exercício de
suspense "conspiração". Mãe,
acabada com a morte do filho,
perceberá algo errado, já que memórias (fotos e vídeos) somem.
Querem convencê-la de que o
menino nunca existiu, e pode-se
pensar em um Preminger de 65,
"Bunny Lake Desapareceu", que
parte de algo similar. Logo nos dirão que são seres "de verdade",
esses que vêm do céu.
Mas, longe da verdade do filme,
e mais significativo para a cultura
dos EUA em 2004, podem ser entidades mais abstratas. Um Deus
corporativo; os senhores sem-cara das planilhas e do tabuleiro político e econômico, talvez. Essencial: aqui, estamos na área do jogo
conspiratório "nacional".
É uma história, a dos EUA, formada sob o eco da conspiração e
de suas fascinantes sombras, vide
Kennedy. Sempre é importante
averiguar, publicar -crenças democráticas. Promover a contaminação entre público e secreto, dispositivos de filmagem e gavetas. O
filme lembra "Arquivo X", e portanto é justo pensar em Michael
Moore e Oliver Stone também.
E "Os Esquecidos" é isso, uma
jornada por conexões negras e camuflagens do sistema, só que em
nome de uma resolução afetiva:
onde está meu filho? E é aqui que
se transita de modo questionável
no registro "conspiração". Se a
heroína confia, e ela confia, tanto
em sua memória, o diretor Ruben
banca isso tingindo o filme com
cores de superdrama, já que mães
e futuras mães vão ao cinema: a
"grande conspiração" jamais poderá entortar os códigos do filme
e, assim, trair a heroína ou a lógica
"mãe vs. todos". Além disso, sem
construir tensão no não-saber e
na "ausência", Ruben hipertrofia
o filme via som e computador.
Mas os seres do céu podem ser
gente de cinema. Há uma febre do
tema memória, sobretudo no cinema dos EUA. Não raro, são filmes que se estruturam na memória referencial e metalingüística,
isto é, na memória cinematográfica (velhos filmes e reciclagens),
para existir. Se na conspiração de
"Os Esquecidos" os ocultos submetem pessoas a um desafio afetivo de memória, a "conspiração"
do universo industrial do cinema
americano mexe quase no mesmo terreno. São "eles", divinos,
que vigiam lá de cima.
Os Esquecidos
The Forgotten
Direção: Joseph Ruben
Produção: EUA, 2004
Com: Julianne Moore, Dominic West
Quando: a partir de hoje nos cines
Bristol, Cinemark Market Place, Kinoplex
Itaim e circuito
Texto Anterior: "Língua: Vidas em Português": Documentário faz tributo ao idioma português Próximo Texto: Erika Palomino Índice
|