São Paulo, sábado, 05 de novembro de 2005

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ARTES PLÁSTICAS

Na Pinacoteca, mostra "Entre Muitos" abriga 60 obras de uma das principais artistas contemporâneas do país

Exposição reúne polaridades de Maiolino

FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL

Há artistas que baseiam sua poética em apenas um suporte (fotografia, pintura, vídeo), e nele desenvolvem toda sua pesquisa. Outros, partem de um caminho inverso e se utilizam dos mais diversos suportes para abordar sua poética. Esse é o caso de Anna Maria Maiolino, escultora, gravadora, pintora, videasta e instaladora. Não há limites para os recursos que a artista utiliza para criar seus trabalhos, como pode ser comprovado na mostra "Entre Muitos", que é inaugurada, hoje, na Pinacoteca do Estado.
Aos 63 anos, Maiolino tem uma das carreiras mais profícuas de sua geração. Participou de mostras históricas, como Opinião 65 e Nova Objetividade Brasileira, ambas no Museu de Arte Moderna do Rio, na década de 60, que determinou um novo caminho para a produção nacional a partir do neoconcretismo, com a busca de vincular arte e vida. Mas, ao contrário de muitos de seus pares daquela época, continuou uma investigadora, inscrevendo-se entre as mais importantes artistas contemporâneas do país.
"Ela não tem uma linha evolutiva, mas momentos de fluxo, é difícil definir seu perfil, se é pintora, escultora. De fato, ela é uma pesquisadora", afirma Paulo Venâncio, curador da mostra.
"Estou sempre numa bifurcação, assim nunca tenho os pés presos em apenas um local. É uma forma de não criar teias de aranha, de não me fixar num mesmo discurso", conta Maiolino em meio à sua instalação "Aqui", no Octógono da Pinacoteca.
"Aqui" é uma versão de outra instalação apresentada na Bienal de São Paulo, em 1998. Composta por dezenas de pequenas esculturas em argila, a obra busca revelar não apenas formas orgânicas mas também o processo criativo da artista a partir do gesto manual.
"É uma instalação viva, já que a argila se transforma ao longo do tempo, em algumas semanas, tudo aqui vai virar pó, mas com água tudo pode ser novamente criado", afirma Maiolino. Esse ciclo vital revela-se presente ao longo de toda carreira da artista, que na Pinacoteca é vista em 60 obras distribuídas por três espaços distintos. Além do Octógono, são utilizadas três salas expositivas e mais um hall de passagem.
"Busquei não organizar a mostra de uma forma cronológica restrita, pois na obra de Maiolino há muitas ressonâncias encontradas em diferentes fases", conta Venâncio. Assim, logo na entrada das salas, três obras tornam-se ícone de seu trabalho: o vídeo "In/Out (Antropofagia)", de 1973, o objeto "Glu, Glu, Glu...", de 1966, e uma escultura dos anos 80, feita com rolinhos, uma de suas marcas. "Sem querer simplificar suas obras, em todos esses trabalhos há uma ligação com o corpo, com elementos orgânicos", afirma o curador. "Eu me considero uma artista do corpo", define a própria Maiolino.

Polaridades
Na mostra, há obras de quase todas as fases da carreira de Maiolino: do momento pop e experimental dos anos 60 até a nova instalação "Aqui".
Em comum, sua poética é marcada por polaridades: cheio e vazio, branco e negro, dentro e fora. Aqui está, aliás, uma das facetas do que a artista afirma ser a "bifurcação". Suas obras estão sempre num momento de tensão, sem uma síntese, deixando ao observador maior liberdade.
Tal marca tem relação com o que Maiolino destaca como uma das inspirações para seus trabalhos: o "resgate do ancestral, quando o homem ainda não usava a linguagem falada, mas as mãos para se comunicar e sobreviver". É como se a artista buscasse uma forma de comunicação mais direta, pré-oral, que torna suas obras aparentemente ingênuas, mas repletas de uma pulsão vital, caso da icônica "Glu, Glu, Glu...", composta por vísceras coloridas na parte inferior e um corpo azulado (asfixiado?) que se utiliza da onomatopéia como recurso pré-linguagem.
Além da mostra na Pinacoteca, Maiolino expõe ainda no Gabinete de Arte Raquel Arnaud, a partir da próxima quarta, com um exposição que complementa a retrospectiva principal. Lá estão seus primeiros desenhos dos anos 60 e novas esculturas, projetadas há mais de dez anos, mas só agora realizadas.
Paralelamente às mostras, dois livros, de outros artistas, são lançados. Hoje, na Pinacoteca, Eliane Prolik lança "Noutro Lugar" (130 págs., R$ 60), com texto de Paulo Herkenhoff e organização de Ivo Mesquita, e na próxima quarta-feira é a vez de Cassio Michalany, com "Como Anda a Cor", com texto de Tiago Mesquita. O artista também apresenta novos trabalhos no Gabinete de Arte.

Anna Maria Maiolino: Entre Muitos - Retrospectiva
Quando: abertura hoje, 11h; de ter. a dom., das 10h às 18h. Até 8/1/2006
Onde: Pinacoteca do Estado (praça da Luz, 2, SP, tel. 0/xx/11/3229-9844)
Quanto: R$ 4

Anna Maria Maiolino: Hilomorfos
Quando: abertura dia 9, 20h; de seg. a sex., das 10h às 19h; sáb., das 11h às 14h. Até 17/12
Onde: Gabinete de Arte Raquel Arnaud (r. Artur de Azevedo, 401, SP, tel. 0/xx/ 11/ 3083-6114)
Quanto: entrada franca; obras de US$ 1 mil a US$ 20 mil (R$ 2,2 mil a R$ 44,6 mil)


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