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Mostra resgata o cinema impuro de Antônio Galante, chamado de "o Roger Corman da Boca do Lixo"
Cinema na boca
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
Antônio Polo Galante, 70, já foi
chamado de "o Roger Corman da
Boca do Lixo", tanto por sua faculdade de produzir filmes rápidos e baratos como por ter dado
impulso à carreira de cineastas
então iniciantes, como Rogério
Sganzerla, Carlos Reichenbach,
Sylvio Back, João Callegaro e David Neves.
Galante entrou no cinema pela
porta dos fundos, como faxineiro
na produtora paulistana Maristela. Mas nos anos 70 era o mais
prolífico produtor do país.
A mostra de filmes "O Cinema
da Boca do Lixo: A Produção de
A. P. Galante", que começa terça-feira no Centro Cultural Banco do
Brasil, em São Paulo, traz uma
parte representativa dessa trajetória, que revela como nenhuma
outra as condições da realização
cinematográfica em nosso país.
Dos cerca de 50 longas-metragens produzidos por Galante desde 1967, 16 estão no ciclo. É uma
filmografia torta, heterogênea,
que vai dos mais canhestros dramas porno-carcerários -como
"Presídio de Mulheres Violentadas" (1976)- ao cinema de invenção do Sganzerla de "A Mulher de Todos" (1969) e do Callegaro de "O Pornógrafo" (1970),
para citar três títulos presentes.
Na produção da Boca do Lixo
paulistana, aliás, eram freqüentes
os curtos-circuitos entre a cultura
popular e a livresca, dada a convivência entre trabalhadores, técnicos, malandros e jovens vindos da
universidade.
Galante serviu como uma espécie de catalisador desse choque de
culturas, conforme revela o escritor e cineasta João Silvério Trevisan no belo documentário "O Galante Rei da Boca", de Alessandro
Gamo e Luís Rocha Melo, incluído na mostra, assim como três
curtas de Ozualdo Candeias sobre
a Boca.
Por um lado, Galante tinha um
tremendo tino empresarial, produzindo filmes baratos de gênero
(cangaço, erótico, artes marciais)
para suprir a demanda dos cinemas populares, numa época em
que a obrigatoriedade de exibição
do filme brasileiro era mais respeitada do que hoje.
Nesse sistema de produção contínua, Galante contava com alguns cineastas habituais, como
Osvaldo de Oliveira e Ody Fraga,
este último especializado em filmes eróticos.
Mas a preocupação constante
com a bilheteria não impedia Galante de conceder espaço para experiências mais autorais, como os
citados filmes de Sganzerla e Callegaro, os dramas erótico-existenciais de Walter Hugo Khouri e
sobretudo os filmes híbridos de
Reichenbach, representados na
mostra por "A Ilha dos Prazeres
Proibidos" (1977) e "Império do
Desejo" (1978).
Autoral e comercial
"A Ilha..." ilustra bem a simbiose que chegou a haver entre o autoral e o comercial sob a égide de
Galante. Para Carlos Reichenbach, seu filme trazia embutida
uma discussão do tema dos exilados políticos. Quando alguém
disse isso ao produtor, este se limitou a dizer: "E daí? O importante é que deu dinheiro".
Um filão explorado por Galante
foi o das paródias de êxitos eróticos internacionais. Na mostra, há
dois exemplos: "A Filha de Emmanuelle" (1978), de Osvaldo de
Oliveira, e "A Filha de Calígula"
(1981), de Ody Fraga.
O formato dos longas de episódios também foi tentado ocasionalmente, gerando frutos como
"As Safadas" (1982), do qual a
mostra traz o episódio "Uma Aula
de Sanfona", cuja singularidade é
ter sido (até agora) o único filme
dirigido pelo escritor, roteirista e
montador Inácio Araujo, crítico
de cinema da Folha.
O CINEMA DA BOCA DO LIXO: A
PRODUÇÃO DE A. P. GALANTE. Onde:
CCBB (r. Álvares Penteado, 112, SP, tel.
0/xx/11/3113-3651). Quando: de 8 a 20/
6. Quanto: R$ 4. Informações: www.cultura-e.com.br.
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