São Paulo, quinta-feira, 06 de julho de 2006

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NINA HORTA

Para que serve o melaço de romã

Num impulso, leitora compra um vidro da essência da fruta no supermercado, e colunista investiga os usos na culinária

UMA LEITORA comprou, num impulso, melaço de romã e me escreveu para saber o que era e para que servia. Comecei a perguntar a amigos e eles me vinham com notícias de romãs, mas nada de melaço. O Donizete, que é poeta, respondeu por e-mail: "Aqui em casa a árvore deu umas seis, enormes, que foram inchando e explodiram.
Comer aqueles grumos, ir desentranhando da casca, é um grande prazer. Principalmente sugar aquele sangue rubi que as sementes soltam. Não é que a Ana tirou todo o erotismo da fruta, arrancou todas as sementes e trouxe em um prato para comer com colher? Aí perto da Abril e do seu "Gourmet Space", como dizem, tem aquelas romãzeiras antigas que ficam carregadas. Há uma no sobradinho da rua Sumidouro que quase não se agüenta de tantas romãs. E pensar que tudo isso vai ser derrubado e virar apartamento com nome estrangeiro. Adeus, pés de camélias grandes e com muitas flores, manacás e romãzeiras. Teremos só aqueles jardins de design. Uma palmeira, uma graminha, aquela coisa horrorosa que chamam de "projeto paisagístico'".
Então, "melaço" o Donizete dizia que não conhecia, mas que também queria ter um vidro da coisa, iria fazer refrescos ou bebidas ou não iria fazer nada, só queria, como a leitora, ter um vidro inútil de melaço. Para falar a verdade, eu também estava doida de desejo. E acabei tendo de perguntar a ela onde havia comprado tal inutilidade. No Pão de Açúcar, me respondeu, sem fazer segredo, e eu agora tenho que retribuir a gentileza e descobrir para que serve a essência da romã.
Os israelitas no deserto tinham saudade da fruta refrescante, e Moisés garantiu que a veriam de novo: "(...) A terra do trigo e da cevada, de vides, figueiras e romãzeiras, terra de oliveiras, abundante de azeite e mel...".
Bonito, mas ainda inútil, ora. Em livros mais modernos, porém, achei. Usam para o faisinjan, que é pato ou frango em molho de romã. (Xi, me lembrei que a leitora é vegetariana radical, quem mandou comprar o que lhe passou na frente?) É um pato em pedaços que se doura em panela com cebolas cortadas. Junta-se 250 g de nozes picadas grosseiramente, três colheres (chá) de melaço, água farta, sal e pimenta-do-reino. Cozinha-se por uma hora e meia, mais ou menos, ou até o pato ficar macio, e ajusta-se o tempero, mais açúcar ou mais limão. Tira-se toda a gordura da superfície.
O melaço também é muito bom em vinagretes, dona vegetariana. E com legumes cozidos, como espinafre, abobrinha ou berinjela. O melhor de tudo, a novidade, é comer esse vinagrete de melaço com ostras frescas, mas cuidado: é só uma colherinha de chá do melaço e um pouco de cebolinha, alho, limão, cubinhos de tomate, sal e pimenta-do-reino. Misture tudo, menos as ostras. Um pouquinho sobre cada ostra e yessss! Ah, e pode fazer manteiga de melaço. É só misturar com a manteiga sem sal e fica boa em tudo o que é grelhado. E pode também passar debaixo da pele de uma galinha antes de assar.
E o suco da romã vai bem com gin, estou falando no suco da romã fresca, mas por que não experimentar com esse melaço? O problema é que o suco da romã solta muito tanino e fica amargo. Junte um pouco de gelatina dissolvida. Ela reage com o tanino e forma um composto insolúvel que pode ser coado. A bebida tem o nome de Especial Stobart.
Oi, leitora, você bebe? Se não bebe, faça uma salada de azeitonas pretas, nozes, salsa, cebolinha, tudo picado com um pouco, cuidado, um pouco do melaço, e o contraste é incrível. Vai bem com melão fresco, será? Humm, só provando. E dá o maior tchan a um peixe assado.
Estamos quites, leitora? Saúde! Com uma taça de gin e lembre-se: um nada de melaço de romã.

@ - ninahorta uol.com.br


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