São Paulo, terça-feira, 06 de novembro de 2007

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Para curador, obras com "quase nada" são potentes

Para Moacir dos Anjos, obras das mineiras refletem sobre a "letargia" no Brasil

Crítico canadense Earl Miller aponta "elemento poético simples" como trunfo de instalação de Laura Belém; "Fiquei comovido", afirmou

COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Dois barcos num lago travam uma conversa luminosa: a luz de um deles acende e a outra responde apagando. Foi a obra "Enamorados", que Laura Belém montou na Bienal de Veneza em 2005, que conquistou o crítico canadense Earl Miller. Ele escreveu elogiando o trabalho e logo chamou a artista para expor no Canadá.
"Fiquei comovido com a obra, porque vi nela um elemento poético simples, que não aparece em obras de outros artistas", contou Miller, por telefone, de Toronto. Ele pediu que Laura indicasse outros artistas que estivessem relacionados à sua obra. Ela sugeriu Cinthia Marcelle, Sara Ramo e Rodrigo Matheus.
De cara com um apanhado da mais nova produção mineira, Miller percebeu em todos uma poesia do cotidiano, usando elementos baratos encontrados na vida doméstica para interpretar, com humor, os absurdos do mundo.
O improviso e o uso de materiais precários justificam, de certa forma, a escolha de Laura e Cinthia para o Panorama da Arte do MAM. Numa mostra em que quase um terço dos artistas convidados são mineiros, o curador Moacir dos Anjos mostra a arte da "gambiarra", que come pelas bordas do sistema. "O trabalho delas está inserido na lógica da gambiarra, mas não só porque lida com objetos precários. As obras que elas constroem se tornam índice da letargia que existe no país", justifica Dos Anjos.
O curador também aponta a capacidade das artistas de provocar deslocamentos que acabam virando metáforas para a situação do país. "Há quase um pudor nos trabalhos. São obras feitas de quase nada, mas que se fixam na memória com potência máxima."

Suportes diversos
Críticos lembram também que as três trabalham com diversos suportes, colocando a idéia em primeiro plano, para depois estruturá-la dentro dos limites do vídeo, da fotografia ou da instalação.
Foi essa diluição de suportes que levou o crítico alemão radicado em Minas Jochen Volz a convidar Cinthia Marcelle para participar da Bienal de Lyon, onde apresentou pela primeira vez "Fonte 193", mesmo vídeo agora exibido no Panorama. "Ela lida com o espaço público fazendo escultura de um jeito que eu nunca vi", afirma Miller.
Pouco depois, o crítico canadense veio ao Brasil para orientar parte da mostra "Comunismo da Forma", que Fernando Oliva e Marcelo Rezende montaram na galeria Vermelho. Lá estava um vídeo de Sara Ramo, em que a artista dança com um boneco, num vácuo tortuoso de solidão. Segundo Oliva, é "um olhar que carrega algo trágico e melancólico". (SILAS MARTÍ)


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