|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Para curador, obras com "quase nada" são potentes
Para Moacir dos Anjos, obras das mineiras refletem sobre a "letargia" no Brasil
Crítico canadense Earl Miller aponta "elemento poético simples" como trunfo de instalação de Laura Belém; "Fiquei comovido", afirmou
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Dois barcos num lago travam
uma conversa luminosa: a luz
de um deles acende e a outra
responde apagando. Foi a obra
"Enamorados", que Laura Belém montou na Bienal de Veneza em 2005, que conquistou o
crítico canadense Earl Miller.
Ele escreveu elogiando o trabalho e logo chamou a artista para
expor no Canadá.
"Fiquei comovido com a
obra, porque vi nela um elemento poético simples, que não
aparece em obras de outros artistas", contou Miller, por telefone, de Toronto. Ele pediu que
Laura indicasse outros artistas
que estivessem relacionados à
sua obra. Ela sugeriu Cinthia
Marcelle, Sara Ramo e Rodrigo
Matheus.
De cara com um apanhado da
mais nova produção mineira,
Miller percebeu em todos uma
poesia do cotidiano, usando
elementos baratos encontrados na vida doméstica para interpretar, com humor, os absurdos do mundo.
O improviso e o uso de materiais precários justificam, de
certa forma, a escolha de Laura
e Cinthia para o Panorama da
Arte do MAM. Numa mostra
em que quase um terço dos artistas convidados são mineiros,
o curador Moacir dos Anjos
mostra a arte da "gambiarra",
que come pelas bordas do sistema. "O trabalho delas está inserido na lógica da gambiarra,
mas não só porque lida com objetos precários. As obras que
elas constroem se tornam índice da letargia que existe no
país", justifica Dos Anjos.
O curador também aponta a
capacidade das artistas de provocar deslocamentos que acabam virando metáforas para a
situação do país. "Há quase um
pudor nos trabalhos. São obras
feitas de quase nada, mas que se
fixam na memória com potência máxima."
Suportes diversos
Críticos lembram também
que as três trabalham com diversos suportes, colocando a
idéia em primeiro plano, para
depois estruturá-la dentro dos
limites do vídeo, da fotografia
ou da instalação.
Foi essa diluição de suportes
que levou o crítico alemão radicado em Minas Jochen Volz a
convidar Cinthia Marcelle para
participar da Bienal de Lyon,
onde apresentou pela primeira
vez "Fonte 193", mesmo vídeo
agora exibido no Panorama.
"Ela lida com o espaço público
fazendo escultura de um jeito
que eu nunca vi", afirma Miller.
Pouco depois, o crítico canadense veio ao Brasil para orientar parte da mostra "Comunismo da Forma", que Fernando
Oliva e Marcelo Rezende montaram na galeria Vermelho. Lá
estava um vídeo de Sara Ramo,
em que a artista dança com um
boneco, num vácuo tortuoso de
solidão. Segundo Oliva, é "um
olhar que carrega algo trágico e
melancólico".
(SILAS MARTÍ)
Texto Anterior: Cecilia Giannetti: A garçonete do pub irlandês Próximo Texto: Brito Cimino reabre com Abramovic, Mario Cravo Neto e Delson Uchôa Índice
|