São Paulo, sexta, 6 de novembro de 1998

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CINEMA - ESTRÉIAS
O furacão Ricci passa por "O Oposto do Sexo"

LÚCIO RIBEIRO
Editor interino da Ilustrada

Em uma corruptela do termo cinematográfico "filme de autor", é apropriado classificar "O Oposto do Sexo" como um autêntico "filme de ator". Ou melhor, "de atriz". A teen Christina Ricci leva nas costas a produção de estirpe independente que estréia hoje no Brasil.
Ricci não é mole, não. Já é a garota da hora na América dos filmes, capa de revista descolada aqui e ali, presença destacada em meia-dúzia de produções recém-estreadas ou por estrear, entre elas "Fear and Loathing in Las Vegas" (livro filmado do visionário e "lesado" escritor Hunter Thompson) e "Buffalo 66", dirigido pelo ator, modelo, pintor e músico Vincent Gallo.
Precisa de pouco mais de dois minutos de "O Oposto do Sexo" para perceber por que Hollywood tem um belo espinho na garganta.
Ricci vem na contramão das novas atrizes que costumam passear pelo Santa Monica Boulevard, em LA. Espécie de Courtney Love da geração Sundance, não é uma das muitas belezocas egressas dos seriados de TV. Gordinha, cara estranha e emburrada, Ricci vive dizendo que no dia em que sentir que está parecendo uma dessas atrizes hollywoodianas "normais" ela vai se achar uma otária.
Introdutório feito, o filme então. "O Oposto do Sexo" é uma comédia das boas sobre Dedee, menina que à luz de seus 16 anos se enche de sua cidade natal, abandona a mãe e resolve passar uns tempos como o meio-irmão gay Bill (o bacana Martin Donovan, ator predileto do diretor cult Hal Hartley).
Encrenca das grandes. Em minutos, Dedee vira para o avesso a vida estável de Bill, seduz o namorado bissexual dele, azucrina a reprimida Lucia (Lisa Kudrow, de "Friends"), se envolve com roubo, assassinato, gravidez.
O imbróglio todo de "O Oposto do Sexo" vem embalado pela divertida narração em off de Dedee, que destila da primeira à última cena seu parecer sobre as vertentes sexuais (os gays são o alvo predileto) e inclusive comentários sobre o roteiro do próprio filme.
Não perdendo de vista que Dedee é uma adolescente, as intervenções dela sobre sexo, família, preconceitos, sensibilidade são divertidas. Impagável seu comentário venenoso logo após a cena em que seu irmão beija o namorado.
Este delicioso "O Oposto do Sexo" cai bem como comédia de humor negro, road movie, filme de apelo sexista e até mesmo terror, dependendo do ponto de vista de quem foca o personagem de Ricci.
A ótima história do filme é escrita pelo roteirista-que-virou-diretor Don Roos, figura indie que pega a câmera pela primeira vez.
É brilhante a idéia de colocar Dedee para narrar o filme, fato muito mais subversivo do que mostrar simplesmente a história de uma teen peralta. Você nunca sabe se Dedee está contando a trama como realmente está acontecendo ou "maquiando" a seu modo. Não raro no filme, ela retorna com seus comentários em off, para mudar de idéia sobre algo que já fez parte de sua narrativa e que de certa forma deu condução à trama.
Para quem pensou que já tinha visto tudo sobre "bad girls" com Alicia Silverstone, Jennifer Jason Leigh e Drew Barrymore, "O Oposto do Sexo" apresenta a vamp Christina Ricci, a mais bem-acabada Lolita deste fim de século. É o primeiro filme destes tempos a mostrar cenas devastadoras de um furacão sem usar efeitos especiais.
²

Filme: O Oposto do Sexo Produção: EUA, 1998 Direção: Don Roos Com: Christina Ricci, Martin Donovan, Lisa Kudrow, Lyle Lovett Quando: a partir de hoje, nos cines Top Cine 1, Center Iguatemi 1 e circuito


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