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VOZES NEGRAS
"Black woman" brasileira aposta nos hits antigos da Motown; sambista atualiza canções de Ary e Noel
Sandra e Mart'nália voltam divergentes
DA REPORTAGEM LOCAL
Enquanto outras aguardam,
Sandra de Sá e Mart'nália voltam ao mercado ao mesmo tempo, lançando trabalhos enormemente distintos em termos de, como gosta de dizer Sandra, MPB
-música preta brasileira.
"Pé do Meu Samba", de
Mart'nália, é trabalho de grande
personalidade pessoal que, ainda
assim, vem tarjado com a forte
marca musical de Caetano Veloso, agora também disposto a abrir
suas asas sobre o samba.
O disco de Mart'nália, filha do
glorioso Martinho da Vila, é, sim,
de samba. Mas vem depurado pelos filtros de sofisticação do samba-canção à Elizeth Cardoso, dos
afro-sambas de Baden Powell e
Vinicius de Moraes ("Tempo Feliz" é uma das faixas), da obsessão
percussiva escravagista de Caetano, da riqueza melódica, harmônica e instrumental geral do Brasil
(a cargo da produção e dos arranjos de Celso Fonseca).
A tez própria de Mart'nália se
impõe na voz rouca e pequena, no
amor confesso pelos temas de fossa de Nana Caymmi, na lembrança da canção militante hoje dissipada de Luiz Carlos Paraná e
Adauto Santos ("De Amor e Paz",
gravada para festival dos 60 pela
hoje matriarca negra Elza Soares).
No final, Mart'nália parece mais
Mart'nália que Caetano, avanço
incrível em relação aos trabalhos
que o mesmo fez com nossa talvez
maior diva negra contemporânea, Virgínia Rodrigues. A identidade segue fraturada, mas luta
com bravura para se recompor.
Algo diferente acontece com
Sandra de Sá (e também com
Lady Zu, pobremente reaproveitada pela Abril no recente "Number One"). Sandra vai na lábia dos
chefões da Universal e verte para
o português standards da Motown em "Pare, Olhe, Escute".
Não se trata aqui de negar que
ela fosse a pessoa ideal para fazê-lo no Brasil, ou que o faça com
brilho. Mas regravar Motown
com arranjos que mimetizam os
originais, num momento em que
a Universal sabe que Paula Lima e
Luciana Mello apontam novos caminhos para a música negra brasileira, é apostar no retrocesso, na
redundância, no anacronismo.
Agrava o caso o fato de as versões para hinos de Smokey Robinson (que participa em pessoa),
Marvin Gaye, Stevie Wonder e
Lionel Richie são sofríveis, beirando nonsense que nem cede à
diversão que havia em a mesma
Sandra traduzir "Fame" e cantar
"vem pro meu lado forever".
Nossa "black woman" número
um, Sandra de Sá continua carecendo de direção, de demarcação
de território, de peito aberto para
sua plena expressão.
Atrás dela, um comboio de divas da diversidade espera também o dia de assumir plenamente
uma identidade que independe de
conceitos de unidade ou variedade. Ave, Arícia Mess, Daúde, Paula Lima, Virgínia Rodrigues, Margareth Menezes, Teresa Cristina,
Dorina, Virgínia Rosa, Luciana
Mello, Alda Rezende, Andréa
Marquee, blablablá...
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)
Pé do Meu Samba
Artista: Mart'nália
Lançamento: Natasha/BMG
Quanto: R$ 25, em média
Pare, Olhe, Escute
Artista: Sandra de Sá
Lançamento: Universal
Quanto: R$ 25, em média
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