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"JORNALISMO INTERNACIONAL"
Abrangente, livro dá uma "aula" sobre a dissertação da notícia
NEWTON CARLOS
ESPECIAL PARA A FOLHA
Um desses veteranos nostálgicos costuma dizer que o jornalista se conhece pela sola do sapato. Se está gasta, é bom, corre
atrás. O jornalista da Folha João
Batista Natali, que acaba de lançar
o livro "Jornalismo Internacional", atualiza este conceito. Ex-editor de Mundo e ex-correspondente da Folha em Paris, são 37
países carimbados no passaporte.
Natali é de tempos de pioneirismo,quando os correspondentes
martelavam máquinas de escrever e em geral dependiam de digitadores de telex.
Como não havia essa nova pulsão na vida do jornalista, a de ficar
de olhos pregados na tela do computador, não faltavam, a quem
quisesse, horas de boa recreação.
Como pegar um trem em Paris só
para ir à ópera de Estrasburgo, o
que Natali fazia com freqüência,
já que inexistiam celulares.
Estamos, portanto, na companhia de alguém muito especial, a
nos conduzir pelo que me parece
ser uma pequena (mas interessantíssima) história do jornalismo em seu espaço internacional.
Com ampla abrangência, apesar
de encaixada em cento e poucas
páginas.
"Jornalismo Internacional", suponho, tem sua origem mais remota na experiência de Natali como correspondente na França,
onde o jornalista chegou numa
época em que a imprensa brasileira despertava para a necessidade
de encarar com nossos olhos o
que se passa no mundo.
Não se trata de manual de jornalismo, embora possa parecer
nas partes em que Natali decreta o
fim dos monoglotas e do redator
só redator, que também não seja
um bom apurador.
O livro traça o percurso do jornalismo internacional desde a
newsletter, citada como primeira
manifestação deste campo de
atuação da imprensa, até esse
confuso bazar de "conteúdos" da
internet.
Atualmente, tempo em que a informação tornou-se um bem público e circula à vontade, o acesso
a ela foi franqueado, e há quem diga que isso esvazia sobretudo as
páginas de "mundo". A vacina
contra este mal, nos ensina Natali,
seria um bom jornalismo, impresso ou não, de "qualificação
diferenciada", tendo à frente
"imensas possibilidades".
Sabe-se que quase não há jornalismo internacional nos currículos das escolas de comunicação.
Por isso, o livro de Natali se torna
ainda mais valioso. A dissertação
sobre a notícia é, em si só, uma
aula.
Entre algumas informações históricas, Natali nos conta que o jornalismo internacional foi instrumento de divulgação, e de injeções de medo, durante a Revolução Francesa e que o "New York
Herald" foi o primeiro jornal
americano a declarar-se apartidário. Acrescento que os jornais
americanos têm como norma
apoiar candidaturas.O papel vergonhoso da imprensa na cobertura da guerra do Iraque, recheado
de autocríticas, merece um livro à
parte.
Natali cita no livro o fato de as
agências de notícias terem dado
viabilidade econômica ao jornalismo internacional. No entanto,
há pontos sobre os quais acho que
é bom falar. Elas têm uma história
de subsídios oficiais e, de imediato, trataram de ajustar-se à ordem
colonial por meio de divisões de
áreas de atuação. A agência Reuters, inglesa, plantou-se mais nas
regiões de maior influência da Inglaterra. A France Presse, francesa, fez o mesmo em relação ao colonialismo francês.
Em 1946, terminada a guerra, os
Estados Unidos, assumindo a
condição de potência mundial,
soltaram por meio do Departamento de Estado o famoso memorando exigindo "liberdade de
informação". Queriam mais espaço para as agências americanas.
Quarto poder? Poder da informação? Ou poder de manipulação? A imprensa empurrou os Estados Unidos para a guerra contra
a Espanha em solo cubano. Campanha que nos remete à de agora,
contra o Iraque, apesar de feita
em termos mais grosseiros.
Em "Jornalismo Internacional",
é mencionada a resistência da
Rússia e da China diante do poder
de veto da França no Conselho de
Segurança da ONU, reunido em
2003 para decidir se aprovaria ou
não a guerra contra o Iraque.
Aproveito para falar que o governo Bush se contentaria com maioria simples de votos no Conselho.
Ele é constituído de cinco membros permanentes com direito a
voto e veto e dez não permanentes, com direito a voto. Uma resolução aprovada, embora vetada,
seria pelo menos uma vitória
"moral" para Bush. Faltava apenas um voto. As pressões foram
enormes em cima de Angola e
Chile, na época membros não
permanentes do conselho. Telefonemas pessoais de Bush. Promessa de tapete vermelho em Washington ao presidente angolano.
Os dois países não cederam, e
nem maioria simples Bush conseguiu. Resistência histórica, é preciso que seja lembrado. Um bom
fecho para um texto sobre jornalismo internacional.
Newton Carlos é jornalista e analista de
questões internacionais
Jornalismo Internacional
Autor: João Batista Natali
Editora: Contexto
Quanto: R$ 23,90 (128 págs.)
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