EDER CHIODETTO
Editor-adjunto de Fotografia

O principal mérito da mostra "A África Por Ela Mesma" e do livro "Antologia da Fotografia Africana e do Oceano Índico" é revelar o olhar do negro sobre ele próprio, isento do fetiche com o qual a pele negra sempre foi, e ainda é, retratada na história da fotografia. Mais que isso, essas imagens colocam em xeque a complexa questão da fotografia antropológica.
Obviamente, não podemos dizer que existe um olhar negro, assim como não existe a fotografia dos brancos, dos amarelos, dos vermelhos. O que está em questão aqui é o quanto um olhar sobre o próprio umbigo, sobre o seu povo, pode ser mais ou menos franco em relação ao olhar do estrangeiro.
Será que ao fotografarmos nós mesmos, nossa família, nossa cidade, seremos mais sensíveis e mais verdadeiros que aqueles que nos observam de fora? Não é verdade que ao nos retratarmos tendemos a ser narcisistas e nostálgicos? Fotografar alguém com o intuito de contar a história do seu próprio povo é como observar um espelho através do visor da máquina.
As pessoas tendem a se representar não como aquilo que são, mas como aquilo que gostariam de ser. Por outro lado, o estrangeiro só consegue extrair do estranho que está na frente da sua câmera a porção exótica que legitima a diferença entre ambos. No caso, o estrangeiro também se enxerga no espelho, mas apenas para contar a diferença aparente entre ele e o outro.
É o labirinto da representação. Pode a fotografia ser o atestado de identidade de um povo se o auto- retrato tende a ser demasiadamente idealizado e o olhar do outro é pura alegoria descolada do real?
Essas imagens de "A África Por Ela Mesma" não respondem a essa questão, mas traz à tona todo um arsenal de imagens feitas a partir de 1840 onde podemos ver claramente esse paradoxo entre o ser e o querer ser, em contraponto com as tão conhecidas imagens de negros feitas para a publicidade, onde os retratados são invariavelmente vistos como seres extravagantes de textura incomum.



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