São Paulo, segunda-feira, 08 de janeiro de 2007

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Oscar terá documentários politizados

Lista de pré-indicados é dominada por filmes que abordam temas controversos, como a Guerra do Iraque

CHARLES LYONS
DO "NEW YORK TIMES"

"Eu não viajei para lá a fim de provar que estou certa", disse a documentarista Laura Poitras sobre sua visita ao Iraque, onde rodou "My Country, My Country" [meu país, meu país], um dos quatro documentários sobre a guerra que disputam indicação ao Oscar deste ano.
"Eu considerava importante compreender essa guerra e documentá-la, e não acreditava que a mídia fosse fazê-lo".
Poitras, 42, filmou com sua própria câmera e registrou o som do documentário sozinha, enquanto acompanhava o trabalho de um médico iraquiano durante oito meses. Sunita e crítico ardoroso da ocupação norte-americana, o médico era candidato a um assento nas eleições para o Conselho da Província de Bagdá, no pleito nacional de janeiro de 2005, mas saiu derrotado.
"My Country, My Country" talvez não seja premiado com o Oscar de melhor documentário, ou nem mesmo consiga lugar entre os cinco indicados, que serão anunciados no próximo dia 23 (a cerimônia ocorre em 25/2.) Mas sua presença entre os finalistas na concorrida lista de documentários -que inclui 14 outros filmes- enfatiza a tendência de premiar produções menos sofisticadas, cinema em estilo de guerrilha, e a disposição de encarar assuntos controversos, não importa quais sejam os obstáculos.
Os documentários que têm por foco questões políticas dominam a lista de 15 finalistas (em uma primeira etapa, 81 filmes atenderam aos critérios de elegibilidade). "Este é o ano do documentário zangado, do documentário cujo objetivo é reconquistar o país", disse Sheila Nevins, presidente da HBO Documentary Films. Os documentários exibidos nas salas de cinema, acrescentou, "substituíram os documentários de televisão, em seu uso como ferramenta de resposta às alegações do governo. Eles se tornaram um dos únicos meios pelos quais se pode fazê-lo".
Mas um pioneiro do gênero, Albert Maysles, não parece entusiástico quanto à tendência. "Eu defendo a teoria de que o realizador precisa se distanciar de um ponto de vista", afirmou.
Falando sobre "Fahrenheit 11 de Setembro", de Michael Moore, diz: "Ele prejudica sua causa porque o método que usa é emboscar pessoas, com o objetivo de provar seu argumento. Se aquilo em que você acredita é certo, por que temer contar a história por inteiro?".
Stanley Nelson, diretor de "Jonestown: The Life and Death of Peoples Temple", que narra a história de Jim Jones, o líder de um suicídio em massa no qual mais de 900 pessoas morreram, na Guiana, em 1978, diz que "era essencial não mostrar aquele homem como apenas maligno. Porque conseguimos manter certa dose de objetividade, nosso trabalho se tornou revolucionário".
O comentário de Nelson reflete um clima no qual a busca de objetividade nos documentários deixou de ser a norma, como ocorria nos anos 50 e 60. Na época, cineastas norte-americanos defendiam o "cinema direto", no qual a câmara ocupava uma posição de observador passivo, ou invisível, capturando imagens mas sem comentar sobre elas.
Alguns dos documentários pré-indicados ao Oscar adotam essa abordagem em escala mais pronunciada, para tratar de temas como aquecimento global, religião e campanha política.
Além do filme de Poitras, três outros dos documentários tratam do Iraque. "Iraq in Fragments", de James Longley; "War Tapes", de Deborah Scranton; e "Ground Truth", de Patricia Foulkrod.
Barbara Kopple, que já ganhou dois Oscar na categoria documentário, disse que mais pessoas assistem a documentários hoje porque desejam ver histórias apaixonadas sobre personagens inesquecíveis. "As audiências são inteligentes o bastante para decidir sem ajuda se concordam com os argumentos que vêem na tela."
Davis Guggenheim, que dirigiu "Uma Verdade Inconveniente", relembra a transformação por que passou após assistir a uma palestra de Al Gore sobre as alterações climáticas, tema de seu documentário. "Quando faço um filme, não tenho em mente o ativismo, mas sim uma experiência. Antes de assistir à apresentação de Al, eu não era ambientalista. Mas vê-la abalou minhas convicções."


Tradução de Paulo Migliacci


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