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"A MAÇÃ"
Obra iraniana retoma mito do gênio teen
INÁCIO ARAUJO
Crítico de Cinema
Desde Rimbaud, vivemos à espera de gênios adolescentes. Com "A
Maçã", Samira Makhmalbaf -18
anos quando realizou o filme-
oferece a mais recente comprovação de que essa é uma hipótese estatisticamente remota.
Por influência de seu pai ou não
-Mohsen Makhmalbaf é um dos
principais cineastas iranianos da
atualidade, diretor de filmes como
"Gabbeh" e "Um Instante de Inocência"-, "A Maçã" chegou ao
Festival de Cannes de 1998, de onde saiu com uma reputação mais
que razoável.
²
Roteiro
O melhor do filme é, de longe,
seu roteiro, baseado em um fato
real: duas meninas com pouco
mais de dez anos, habitantes de
uma localidade pobre de Teerã, filhas de uma mãe cega, viviam fechadas em sua casa desde o nascimento. Só depois que vizinhas chamam a atenção do serviço social
para o fato, é que as meninas começam a fazer suas primeiras experiências no mundo exterior.
O ponto central do roteiro, e que
o vincula a Makhmalbaf-pai, é a
teia que realidade e ficção vão tecendo a partir do momento em
que se encontram. Fato e filme,
história e representação têm demonstrado um potencial de sugestão e encantamento grandes nos
filmes de Mohsen.
Não são meras dramatizações de
episódios reais, como nos "docudramas". Exemplo: as duas meninas que fazem os papéis das jovens
prisioneiras são as mesmas que viveram o drama na vida real.
²
Telefilme
Não se trata apenas de agregar
realidade ao filme, identificando
personagens a protagonistas. O fato e sua representação defrontam e
se questionam continuamente
Em Samira, esse procedimento é
usado estranhamente. Ora as meninas de "A Maçã" parecem saídas
de um filme de Makhmalbaf-pai,
ora de um telefilme.
Há momentos em que pressentimos a ligação tortuosa entre coisa e
signo, tão frequente nos cineastas
do Irã. Em outros, limitamo-nos a
acompanhar a metáfora mais ou
menos óbvia indicada pela história: as crianças que crescem presas
em uma casa, sem contato com o
mundo exterior, são, em certa medida, o próprio Irã -um país que,
após anos de fechamento, desde a
revolução xiita dos anos 70, hoje
deve aprender a tatear o mundo,
conhecendo-se a si mesmo e aos
outros ao mesmo tempo.
Em suma, Samira também tateia,
num trabalho a que as incertezas
do estilo dispersam por vezes o poder de sugestão do roteiro, mas
que nunca é indigesto, desagradável ou pretensioso (como "A Eternidade e um Dia", digamos, do
grego Theo Angelopoulos).
²
Filme: A Maçã
Produção: Irã/França, 1998
Direção: Samira Makhmalbaf
Com: Massoumeh Naderi e Zahra Naderi,
entre outros
Quando: estréia hoje, no Espaço Unibanco 1
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