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Ciclo avalia Debord e situacionistas
Filmes, debate e intervenção estão na mostra do CCBB sobre grupo que questionou sociedade de consumo
CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA
Às vésperas da entrada inevitável dos eventos de maio de
1968 na chamada crise da meia-idade, o ciclo "Que Situação,
hein, Debord?", que ocupa o
Centro Cultural Banco do Brasil paulistano a partir de hoje
(até o dia 24) e carioca (do dia
22 a 3/5), traz a oportunidade
de ser menos comemorativo e
mais reflexivo sobre a última
revolta a entrar para a história
da esquerda.
O foco da programação são as
idéias situacionistas, produto
de um grupo de pensadores
que, na passagem dos anos 50
para os 60, chamou a atenção
para os efeitos negativos da sociedade de consumo.
Um ciclo de filmes, quatro
debates e uma ação coletiva de
intervenção urbana é a proposta dos curadores do evento, que
visa discutir o legado situacionista a partir de três áreas: urbanismo, cultura digital e crítica da comunicação.
A programação de filmes,
que reúne documentários e
manifestos coletivos sobre o
estado da revolta na sociedade
contemporânea, traz como
atração fundamental o conjunto dos trabalhos audiovisuais
de Guy Debord, intelectual
eleito à sua revelia um guru das
idéias situacionistas.
Constituída por seis títulos, a
filmografia de Debord desafia
os códigos tradicionais de construção e análise daquilo que se
convencionou chamar cinema.
O ciclo de filmes é a oportunidade de verificar como Debord converte o audiovisual em
um cavalo-de-tróia no combate
às regras dominantes da sociedade do espetáculo, núcleo de
sua produção intelectual.
Seus filmes não se reduzem a
um exercício formalista ou à
prática de estratégias antiilusionistas, como ainda imagina
possível o resíduo da vanguarda. Nem se trata de usar o cinema como um veículo de transmissão de teses.
Anticinema radical
O que Debord propõe é um
anticinema, exemplificado desde seu primeiro título, "Uivos
para Sade" (1952), um exercício
de 75 minutos no qual a figuração é substituída por projeções
em branco e em preto e falas
entrecortadas, que culmina
com 24 minutos finais de tela
escura e sem som.
A radicalidade ganha mais
ossatura no fundamental "A
Sociedade do Espetáculo", realizado por Debord em 1973, cinco anos após a as revoltas de
1968. Aqui, a uma sucessão de
imagens roubadas da cultura
do espetáculo se sobrepõem
leituras de passagens das teses
escritas por Debord, num efeito que não é nem o do exemplo
nem o da demonstração, mas,
sim, o de acumulação de indícios, como o praticado por detetives na cena de um crime.
Ainda mais essencial é "In
Girum imus nocte et consumitur igni", palíndromo em latim
que significa "giramos na noite
e fomos devorados". Feito em
1978, constitui um exercício de
memória em que o sempre premonitório Debord já propunha
a anulação dos efeitos mumificadores da nostalgia, tentação
máxima dos que vivem em busca de um tempo perdido.
QUE SITUAÇÃO, HEIN, DEBORD?
Quando: de hoje a 24/4; veja programação em www.bb.com.br
Onde: Centro Cultural Banco do Brasil
(r. Álvares Penteado, 112, SP, tel. 0/
xx/ 11/3113-3651)
Quanto: entrada franca
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