São Paulo, terça-feira, 08 de abril de 2008

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Ciclo avalia Debord e situacionistas

Filmes, debate e intervenção estão na mostra do CCBB sobre grupo que questionou sociedade de consumo

CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA

Às vésperas da entrada inevitável dos eventos de maio de 1968 na chamada crise da meia-idade, o ciclo "Que Situação, hein, Debord?", que ocupa o Centro Cultural Banco do Brasil paulistano a partir de hoje (até o dia 24) e carioca (do dia 22 a 3/5), traz a oportunidade de ser menos comemorativo e mais reflexivo sobre a última revolta a entrar para a história da esquerda.
O foco da programação são as idéias situacionistas, produto de um grupo de pensadores que, na passagem dos anos 50 para os 60, chamou a atenção para os efeitos negativos da sociedade de consumo.
Um ciclo de filmes, quatro debates e uma ação coletiva de intervenção urbana é a proposta dos curadores do evento, que visa discutir o legado situacionista a partir de três áreas: urbanismo, cultura digital e crítica da comunicação.
A programação de filmes, que reúne documentários e manifestos coletivos sobre o estado da revolta na sociedade contemporânea, traz como atração fundamental o conjunto dos trabalhos audiovisuais de Guy Debord, intelectual eleito à sua revelia um guru das idéias situacionistas.
Constituída por seis títulos, a filmografia de Debord desafia os códigos tradicionais de construção e análise daquilo que se convencionou chamar cinema.
O ciclo de filmes é a oportunidade de verificar como Debord converte o audiovisual em um cavalo-de-tróia no combate às regras dominantes da sociedade do espetáculo, núcleo de sua produção intelectual.
Seus filmes não se reduzem a um exercício formalista ou à prática de estratégias antiilusionistas, como ainda imagina possível o resíduo da vanguarda. Nem se trata de usar o cinema como um veículo de transmissão de teses.

Anticinema radical
O que Debord propõe é um anticinema, exemplificado desde seu primeiro título, "Uivos para Sade" (1952), um exercício de 75 minutos no qual a figuração é substituída por projeções em branco e em preto e falas entrecortadas, que culmina com 24 minutos finais de tela escura e sem som.
A radicalidade ganha mais ossatura no fundamental "A Sociedade do Espetáculo", realizado por Debord em 1973, cinco anos após a as revoltas de 1968. Aqui, a uma sucessão de imagens roubadas da cultura do espetáculo se sobrepõem leituras de passagens das teses escritas por Debord, num efeito que não é nem o do exemplo nem o da demonstração, mas, sim, o de acumulação de indícios, como o praticado por detetives na cena de um crime.
Ainda mais essencial é "In Girum imus nocte et consumitur igni", palíndromo em latim que significa "giramos na noite e fomos devorados". Feito em 1978, constitui um exercício de memória em que o sempre premonitório Debord já propunha a anulação dos efeitos mumificadores da nostalgia, tentação máxima dos que vivem em busca de um tempo perdido.


QUE SITUAÇÃO, HEIN, DEBORD?
Quando:
de hoje a 24/4; veja programação em www.bb.com.br
Onde: Centro Cultural Banco do Brasil (r. Álvares Penteado, 112, SP, tel. 0/ xx/ 11/3113-3651)
Quanto: entrada franca




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