São Paulo, segunda-feira, 08 de maio de 2006

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MÚSICA

No quarto disco solo, cantor reúne sambistas e rappers e ataca ex-parceiros

Marcelo D2 usa o samba para aprofundar o rap

ADRIANA FERREIRA SILVA
ENVIADA ESPECIAL AO RIO

Já não é só a defesa da mistura do rap com samba que preocupa Marcelo D2, 38. Em seu novo disco, "Meu Samba É Assim", ele utiliza o estilo que lhe rendeu milhares de cópias vendidas de seus dois últimos álbuns, "À Procura da Batida Perfeita" e "Acústico MTV", para peitar ex-companheiros que o criticaram e, assim, fez um disco mais rap do que nunca.
Em entrevista à Folha, D2 falou sobre o novo trabalho, o que pensa do rap brasileiro e desceu a lenha em ex-parceiros.

Folha - Apesar do título, esse é seu CD mais rap, não é?
Marcelo D2 -
Também acho, por isso chamei de "Meu Samba É Assim". Mas, ao mesmo tempo, é o que fui mais fundo no samba: botei escola de samba, vozes de sambistas, a Alcione, o Zeca [Pagodinho] e o Arlindo [Cruz] e usei temáticas do samba nas letras.

Folha - Há mais jazz também?
D2 -
Esse trio, Felipe Baden [piano], Maurinho [baixo] e Lourenço [bateria], que toca na minha banda é totalmente jazzista. Temos feito jazz pra caramba. Quando falo em samba, é de uma maneira geral. Falo de samba-jazz, bossa nova, samba-rock.

Folha - De onde vem o lado rap?
D2 -
Colocamos os beats lá na frente. Falava para o [produtor] Mario [Caldato]: "O bumbo tem de ser como um soco e a caixa, como um tapa. Isso é mix de disco de rap: bumbo, caixa e voz lá na frente e o resto um pouco atrás.

Folha - Interferiu na produção?
D2 -
Sou co-produtor de todos os discos. Aprendi muito com o Mario nestes nove anos que a gente trabalha junto. No rap brasileiro pode haver bons produtores, mas melhor que eu não tem.

Folha - O CD tem o rapper Chali Tuna e o DJ Cut Chemist, do Jurassic 5. Como rolou a participação?
D2 -
Quando começou essa onda de rap underground na América, estava indo para lá lançar meu primeiro disco, que tem essa cara de underground por causa disso. É a galera que me inspira.

Folha - Por que escolheu "O Gueto", a faixa mais rock, para estrear nas rádios?
D2 -
Dentro do contexto pop rock das rádios hoje, ela é a que mais se encaixa. Também gosto da letra, acho que é a melhor do disco. O primeiro single nunca é o mais forte, e esse é um CD que quero trabalhar muito tempo. Dois anos, no mínimo.

Folha - Seus CDs venderam 125 mil e 160 mil cópias. Foi surpresa?
D2 -
Não esperava que fizesse tanto sucesso. Na época, estava voltando de Los Angeles, ouvindo "À Procura...", e pensei: "Onde vai tocar esse disco? Não vai ser em rádio de samba nem de rock. Rádio de rap não existe".

Folha - Por que que estourou?
D2 -
Vários fatores: o rap americano cresceu muito no Brasil e isso deu uma ajuda. Começaram a tocar Eminem e Marcelo D2, Jay-Z e Marcelo D2. E teve um momento de orgulho nacional, de "opa, temos nosso rap com samba: Marcelo D2". Além de tudo, foi novidade. Podia muito bem ter feito um pop rock, mas não. Fiz essa parada e acabou dando certo.

Folha - Misturar rap com samba não pode se tornar uma fórmula?
D2 -
Não acho que seja uma fórmula inesgotável. Se todo mundo começar a fazer, a vender refrigerante e sanduíche, vou para outro lugar. Não tenho medo de mudar. Fazer só samba. Ou só rap. Na verdade, faço rap. Racionais [MCs] não sampleia funk? Eu sampleio samba.

Folha - Em 2000, você disse que não iria ao Faustão, mas depois acabou indo lá, na loja Daslu...
D2 -
Nunca iria ao Faustão com um trabalho como o Planet Hemp. Mas, com "À Procura...", vi um horizonte para ir porque estava a fim de que as pessoas ouvissem uma música nova. Se não fosse por esse caminho, o disco ficaria num marasmo. Tento manter uma coerência. Não quero ser um cara que faz qualquer parada.

Folha - Você foi criticado, não?
D2 -
Não é fácil fazer sucesso. Todo mundo começa a te criticar, dizer que você está vendido. Que tem dinheiro, mudou. Lógico que mudei, fui para uma casinha melhor. Todos cobram muito, mas não é qualquer um que tem coragem de ir ao Faustão, cantar e se manter autêntico. Está na hora de o rap se assumir como música brasileira, como arte. Minha intenção é fazer arte para a massa.

Folha - E o rap nacional?
D2 -
Anda a passos de tartaruga. Ninguém faz nada. Parece que tem uma cartilha: para ser rapper você tem que olhar de cara feia, não falar com a imprensa, xingar o sistema. Por quê, cara?

Folha - Quando o Planet Hemp voltou, em 2000, vocês disseram que lançariam mais dois discos. Não vai rolar?
D2 -
Já era. Tenho vontade, mas agora não rola mais.

Folha - Por quê?
D2 -
Hoje, principalmente, porque os caras começaram a falar merda do Planet Hemp. Como é que o BNegão e o Black Alien falam mal do Planet? Se não fosse a banda, esses caras não seriam nada. Eu me orgulho disso, por que eles não se orgulham? Acho que o Planet e a galera que gostava da banda merecem mais respeito.

Folha - Está chateado com eles?
D2 -
Estou magoado. O BNegão vivia nas minhas costas e agora vai numa revista falar que sou capitalista. Agora vive nas costas do Falcão, é backing vocal do Rappa. Assume logo que é backing vocal e deixa o Planet Hemp.


A jornalista Adriana Ferreira Silva viajou a convite da gravadora Sony BMG


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