São Paulo, quinta-feira, 08 de novembro de 2007

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Em livro, Pamuk constrói alegoria entre leste e oeste

Em "O Castelo Branco", de 1985, que sai agora no Brasil, autor confronta Oriente e Ocidente com personagens idênticos

Pamuk aponta referências a Borges e Allan Poe em seu romance; próximo livro, "Museum of Innocence", sairá na Feira de Frankfurt 2008

EDUARDO SIMÕES
DA REPORTAGEM LOCAL

Em 1985, então com 33 anos, o escritor turco Orhan Pamuk ainda não havia alcançado notoriedade internacional quando lançou "O Castelo Branco", que sai agora no Brasil. Nele, Pamuk fez uma alegoria da relação entre Oriente e Ocidente, tema que marca quase toda sua obra, através de um recurso caro à literatura mundial: a figura do "Doppelgänger", o "duplo".
No romance, Pamuk retoma um personagem de seu segundo livro, "A Casa Silenciosa", o acadêmico Faruk Darvinoglu, que, num prefácio, revela ter achado um manuscrito do século 17. O texto narra a história de um jovem italiano aprisionado por uma esquadra turca, levado a Istambul e feito escravo de um turco idêntico a ele.
Os personagens passam a trocar seus conhecimentos e visões de mundo ao ponto de o italiano se "orientalizar" e de o turco se "ocidentalizar".
"O livro foi minha contribuição ao gênero, sendo que utilizo, de forma alegórica, o Ocidente e o Oriente como "duplos'", diz Pamuk à Folha, apontando aí referências a autores como Jorge Luís Borges (especificamente o conto "A História do Guerreiro e da Cativa", de "O Aleph"), e Edgar Allan Poe ("William Wilson").
Pamuk, no entanto, ressalta que o livro não se limita à metáfora da relação "leste-oeste". "Afora os elementos simbólicos, trata-se da história de dois indivíduos solitários que tentam se descobrir ensinando, um ao outro, tudo que sabem."

Periferia
Orhan Pamuk esteve no Brasil em 2005, quando participou da Festa Literária Internacional de Paraty. Da literatura brasileira, conhecia obras de Clarice Lispector e de Machado de Assis, a quem considera bastante moderno e experimental para seu tempo. De sua passagem pelo país, lembra-se das andanças no Rio, que compara a Istambul. Além dos "contrastes entre a ruína e o moderno", ambas teriam a mesma qualidade melancólica de quem vive na periferia do Ocidente.
Em 2006, Pamuk recebeu o Nobel de Literatura, tido como indicação da intelligentsia européia de apoio político ao escritor, que no ano anterior havia sido acusado pela Turquia de ofender a nação. Pamuk havia dito a um jornal que seu país fora responsável pelo genocídio de armênios e curdos.
O escritor, que viu o alcance de sua obra aumentar após o Nobel -segundo ele mesmo, de um número relativamente pequeno de traduções para mais de 50- lamenta que todo o episódio tenha feito com que jornalistas do mundo todo o vejam mais como uma figura política do que um autor de ficção -o ofício que reitera e descreve em discursos como o que fez ao receber o Nobel, presente em "A Maleta do Meu Pai", também lançado agora no país.
Pamuk não se esquiva, no entanto, de comentar as ameaças da Turquia de invadir o norte do Iraque em retaliação aos ataques da guerrilha do Partido dos Trabalhadores do Curdistão. "Tenho a esperança de que tudo se resolva pelos caminhos diplomáticos", diz.
Temas como política e guerra não devem sair da agenda de Pamuk tão cedo, no entanto. Vencedor do prêmio da Paz na Feira de Frankfurt em 2005, antes mesmo de receber o Nobel, o escritor voltará à cidade em 2008, quando o evento homenageia a literatura turca. Pamuk, que lançará na Alemanha seu novo romance, "Museum of Innoncence" (museu da inocência), espera que a feira coloque em debate questões como a censura e a conflituosa relação de seu país com os curdos.


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