São Paulo, quarta-feira, 09 de fevereiro de 2011

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música

CRÍTICA ROCK

PJ Harvey retorna cerebral e pudica

Álbum temático sobre as batalhas militares da Inglaterra abandona apelo sexual da cantora

THALES DE MENEZES
DE SÃO PAULO

Polly Jean Harvey gosta de mudar. Troca de estilos musicais, de guarda-roupa e de corte de cabelo a cada álbum.
Até o nome já trocou, antes era P.J. Harvey, agora pede que escrevam PJ Harvey.
Por isso, o fato de seu oitavo álbum solo soar diferente de tudo que ela lançou antes não surpreende. Mas "Let England Shake", que chega às lojas do planeta na próxima segunda-feira (14), deixa de lado o inegável poder de atração sexual da cantora.
As músicas são ótimas, quase todas poderiam ser lançadas como um novo single e os fãs de PJ iriam adorar. O que causa estranheza é olhar o conjunto da obra.
A cantora adota pela primeira vez o formato do "álbum conceitual". O tema é a Inglaterra e sua história de combates militares. Nas letras, o tom vai de simpática nostalgia de um país que já foi muito poderoso ao deboche inclemente dirigido aos donos do poder.
Assim, as letras alternam hinos e lamentos. Numa audição apressada, alguém poderia fazer comparações com "The Final Cut" (1983), o disco conceitual do Pink Floyd em que Roger Waters exorcizou fantasmas de guerra, mas ali são letras narrativas.
PJ, por sua vez, escreve intrincados poemas nos quais as imagens, a princípio desconexas, vão formando painéis sobre glória e morte no campo de batalha.
Musicalmente, a ruptura com as baladas ao piano de "White Chalk" (2007), seu álbum anterior, é brutal.
Entre variações de peso, as canções de "Let England Shake" soam às vezes quase hipnóticas, efeito causado por acordes repetitivos que PJ toca em sua autoharp.
Apesar do nome remeter à harpa, esse instrumento criado em 1926 é na verdade uma cítara, com as cordas presas por amortecedores reguláveis a uma placa. Atual brinquedinho favorito da cantora, imprime uma aura marcial às músicas. Guitarras e bateria entram em batidas curtas, querendo representar tiros e explosões.
Em "The Glorious Land", faixa em que PJ começa a cantar suave e, aos poucos, solta o vozeirão furioso, não falta uma cornetinha de cavalaria de filmes de caubói.
Nessa empreitada, PJ levou seus antigos amigos e colaboradores, os músicos e produtores John Parrish (com quem ela lançou dois álbuns, em 1996 e 2009) e Mick Harvey, que foi do Bad Seeds, banda de apoio do australiano Nick Cave.
Apesar de criativo, divertido e bem tocado, "Let England Shake" corre risco de rejeição por parte dos seguidores antigos de PJ.
Mesmo em uma carreira com muitas caras diferentes, desde a espetacular estreia em "Dry" (1992) um elemento foi constante no trabalho da cantora britânica: uma carga sensual arrebatadora. Clipes e, principalmente, shows de PJ sempre seduziram fãs. Mas os vídeos do novo disco, "The Words that Market Murder" e "The Last Living Rose", trazem a musa bem comportada.
Nenhuma faixa do álbum apresenta o registro mais grave e sensual da voz dela, antes uma marca registrada.
Resta saber agora se todos vão aprovar essa PJ Harvey mais cerebral e assexuada.

LET ENGLAND SHAKE

ARTISTA PJ Harvey
LANÇAMENTO Vagrant Records
QUANTO R$ 25, em pré-venda no site www.amazon.com
AVALIAÇÃO ótimo


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