São Paulo, sexta-feira, 09 de março de 2007

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Crítica/MPB

Guinga se solta como cantor em novo álbum

LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO

Guinga estreou em disco já aos 41 anos, em 1991, com "Simples e Absurdo". Mas eram os outros que cantavam suas músicas, não ele. Nos cinco CDs seguintes, interpretou algumas faixas, mas é agora, em "Casa de Villa", que o violonista se mostra mais maduro como cantor.
"Estou [no CD] com a voz rouca do cantor que não sou. Mas alma e emoção eu tenho.
Chico Buarque e Tom Jobim nunca quiseram ser cantores e são os maiores intérpretes de suas obras", afirma ele, que sempre ouviu de Djavan e outros especialistas o incentivo para cantar mais.
Oito das 12 faixas têm sua "voz rouca" -as outras são instrumentais. E Guinga ainda se permite ousadias: faz um difícil contracanto em "Via Crucis", a única música com intérprete convidada (Paula Santoro), e experimenta o formato voz & violão em "Tudo Fora de Lugar", bela parceria com Aldir Blanc.
As inovações mostram um artista mais corajoso e exposto. Seus CDs anteriores, invariavelmente bonitos, eram cercados por muitos instrumentos, inclusive cordas. Sob influência do produtor Marcus Tardelli, exímio violonista solo, Guinga conta com poucos músicos ao seu redor e encontra uma justa medida para sua obra.
Se é que ainda era necessário, fica ainda mais nítido em "Casa de Villa" a capacidade que ele tem de fundir e reescrever os gêneros. Em "Bigshot", une ragtime e xote, sopros e zabumba. Em "Jongo de Compadre", o gênero afro-brasileiro do título ganha curvas bem diferentes e até tuba. Dos choros e valsas, pode-se falar muita coisa, menos que são previsíveis ou passadistas.
"Progredir dentro da tradição é sempre possível. Não vou fazer um choro nos moldes do que já foi feito, ficar preso a uma coisa que está estabelecida há um século", ensina Carlos Althier de Souza Lemos Escobar, dentista que trocou de vez o boticão pelo violão.
Villa-Lobos é o maior homenageado do CD. "A casa de Villa é o meu coração", declara-se Guinga. "Villalobiana" e a faixa-título são as reverências explícitas, mas o grande compositor não é uma influência apenas sonora para Guinga.
Está nas suas misturas de erudito e popular, simples e absurdo, zona sul e subúrbios. Estes são lindamente cantados em "Mar de Maracanã" (parceria com Edu Kneip) e "Maviosa", a primeira letra que o compositor teve coragem de gravar. Os versos são um passeio agridoce pelo Baixada Fluminense e pelos bairros que ladeiam a avenida Brasil.
"Ainda tem beleza [nos lugares]. Para quem sabe ver, né?", diz Guinga, traduzindo muito da sua música, que, em tempos de felicidade eletrônica-desarmônica, mostra que a dor pode ser bela.
Ainda pouco conhecida no Brasil, sua obra está ultrapassando fronteiras: ele tem três discos feitos na Itália, ainda não lançados aqui; e fez em dezembro passado concerto com a Filarmônica de Los Angeles.


CASA DE VILLA     
Artista: Guinga
Gravadora: Biscoito Fino
Quanto: R$ 32, em média


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