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São Paulo, sexta-feira, 09 de maio de 2003

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Trabalhos de VJs brasileiros consolidam-se em festas com temáticas politicamente engajadas

Visões coletivas

DA REDAÇÃO
DA REPORTAGEM LOCAL

Até ontem ninguém tinha ouvido falar em VJ. Foram alguns eventos como o Red Bull Academy, o festival Eletronika e o Hype darem espaço para os ditos, que a história mudou.
"Pela primeira vez conseguimos um camarote, no Sesc", comemora Giuliano Scandiuzzi, integrante do grupo Bijari, responsável pelas projeções do festival Hype, que acontece até amanhã em SP.
Um dos pioneiros da cena VJ paulistana, o grupo tem dividido os mixers com outros nomes como Embolex e Spetto, convidados pelo grupo para participar do festival. As parcerias, cada vez mais comuns, só se tornaram possíveis com o desenvolvimento das ferramentas de manipulação de imagens, não raro desenvolvidas pelos próprios artistas.
"Meu trabalho tem esse viés político desde a ferramenta que utilizo para gerar as animações até o conteúdo delas", diz o VJ Spetto, que criou seu próprio software de geração de imagens, o VRStudio. Uma das premissas do aplicativo é justamente a cessão de direitos autorais, uma vez que pode ser baixado gratuitamente na internet e modificado pelo usuário.
Também criador de seus próprios programas de manipulação de imagem, o grupo multiétnico 242.pilots, sediado em Nova York, parece ter alcançado o reconhecimento merecido: sua performance, que reúne três VJs manipulando imagens ao mesmo tempo, foi premiada na edição deste ano do festival multimídia Transmediale, na Alemanha.
"Até agora, o vídeo nas danceterias era encarado apenas como decoração, como um papel de parede animado a que você não prestava muita atenção. Nós acreditamos que deve ser mais do que isso, assim tocamos em pequenas apresentações, galerias de arte ou museus, geralmente para um público sentado", conta o americano Kurt Ralske, do 242.pilots.
Ao contrário das festas no Brasil e na Europa, onde a politização aumenta com o crescimento dos eventos antiglobalização, Ralske lamenta a falta de conscientização na eletrônica norte-americana. "Todo o grupo tem fortes convicções políticas, mas não as mostramos de forma óbvia durante as projeções", diz o VJ. "Se houvesse uma cena por aqui, certamente estaríamos envolvidos."
A crescente movimentação em torno de uma música eletrônica mais engajada é reflexo de uma superexposição e quase banalização do estilo, afirmam alguns dos principais VJs e produtores.
Para o VJ Spetto, essa nova postura configura-se como uma espécie de volta aos princípios originais da eletrônica no Brasil, no meio dos anos 90.
"Quando as primeiras raves começaram a acontecer no Brasil, havia um espírito de contracultura: elas aconteciam longe da cidade, era muito difícil chegar e apenas determinadas pessoas participavam", diz Spetto.
"Além de cair no gosto nosso, esse lance underground fica próximo do antipop, de estar fora do eixo das gravadoras. A gente é que faz a balada acontecer", afirma o VJ Flávio, do Bijari.
O caminho natural é conhecido por qualquer uma das 43 mil pessoas que estiveram no mais recente Skol Beats: patrocínio de uma grande corporação e culto ao artista (DJ), justamente o que a eletrônica propunha como diferencial de outros estilos.
"Essa movimentação que acontece agora é uma volta aos princípios básicos da eletrônica", diz Daniel Gonzales, do núcleo da festa Temp. "As pistas se tornaram, em sua maioria, simples playgrounds, espaço para diversão e alienação."
O trabalho do VJ Spetto serve como demonstração dessa produção engajada. Em suas projeções, o VJ alterna imagens do presidente norte-americano, George W. Bush, com o vilão da série "Star Wars", Darth Vader. Em outras, aparecem o guerrilheiro Che Guevara (1928-67) vestido como palestino ou o terrorista Osama bin Laden e o presidente da ANP (Autoridade Nacional Palestina), Iasser Arafat. "Tento mostrar que não há bonzinho nem vilão nessa história."
(BRUNO YUTAKA SAITO E DIEGO ASSIS)


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