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LIVRO/ARTES PLÁSTICAS
Cor de Michalany
atua sem caprichos direto no mundo
TIAGO MESQUITA
CRÍTICO DA FOLHA
Desde o fim da década de 70,
o artista Cassio Michalany
desenvolve um bom antídoto
contra a inflação de caprichos que
hoje tenta tomar conta da arte
contemporânea.
Sua pintura evita todo o glamour, firula ou apego ao efeito. A
cor já aparece muito impessoal,
quase anônima, mas para mostrar sua densidade não pode entrar como um ornamento ou
acessório, ela deve estar presente
e limitada, como um elemento
que atua direto no mundo, de
frente para ele.
Por isso as telas que o pintor justapõe não se prestam ao luxuoso
ou ao ostensivo, próximas do que
poderia ser entendido como não
artístico. Devem apresentar a cor
como um elemento raso, dentro
do mundo.
Formas simplificadas
A forma não conforma os elementos a uma vontade exterior a
eles, o mundo já exagera nisso.
Generosa e altiva, ela agrupa as
faixas coloridas buscando a maior
versatilidade relacional entre elas.
Como se essas formas simplificadas pudessem se mostrar menos
pálidas, em facetas antes recalcadas.
Talvez por insistir em explorar
os mesmos procedimentos ou pelo grau de impessoalidade e de
não artístico que existe em suas
pinturas, essa obra por vezes é vista como fria e repetitiva.
O retrospecto das pinturas presente na monografia sobre o artista, "Cassio Michalany - Pinturas",
publicada pela Cosac & Naify,
bem como o texto de Rodrigo Naves que a acompanha parecem indicar o contrário.
Ao longo do tempo, o pintor foi
desdobrando o seu procedimento. Passava de uma faixa de cor a
outra como se procurasse uma
outra ordem das coisas. Existe algo de permutação, de um jogo livre entre as faixas.
Mas o é com muito rigor, as cores certas procuram maneiras
mais prazerosas de se acertar.
O ensaio de Rodrigo Naves nos
ensina que o artista se detém sobre esse "esquema" buscando reverter "a serialização que comanda os nossos dias".
Cores autônomas
O curioso é que, com o passar
dos anos, as cores de Michalany
apareceram mais autônomas. Na
análise de Naves das obras de 1979
a cor é empenhada em um projeto
de harmonização além dela.
Nos últimos quadros, as cores se
arranjam respeitando os limites
umas das outras, com tolerância e
vontade de encontrar formas de
se relacionar em que nossas vontades apareçam menos avulsas.
Decerto estamos em uma outra
etapa histórica. Essa relação é esmiuçada de maneira exemplar no
ensaio.
O pintor tem algo do que o poeta Baudelaire viu em Constantin
Guys como o pintor da vida moderna: uma disposição para encontrar alegrias possíveis e a força
potencial de um mundo novo que
nos surge e ao mesmo tempo assusta e fascina.
Cassio Michalany - Pinturas
Autores: Rodrigo Naves e Cassio Michalany
Editora: Cosac & Naify (tel. 0/xx/11/255-8808)
Quanto: R$ 92 (82 págs.)
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