São Paulo, quinta-feira, 09 de agosto de 2001

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LIVRO/ARTES PLÁSTICAS

Cor de Michalany atua sem caprichos direto no mundo

TIAGO MESQUITA
CRÍTICO DA FOLHA

Desde o fim da década de 70, o artista Cassio Michalany desenvolve um bom antídoto contra a inflação de caprichos que hoje tenta tomar conta da arte contemporânea.
Sua pintura evita todo o glamour, firula ou apego ao efeito. A cor já aparece muito impessoal, quase anônima, mas para mostrar sua densidade não pode entrar como um ornamento ou acessório, ela deve estar presente e limitada, como um elemento que atua direto no mundo, de frente para ele.
Por isso as telas que o pintor justapõe não se prestam ao luxuoso ou ao ostensivo, próximas do que poderia ser entendido como não artístico. Devem apresentar a cor como um elemento raso, dentro do mundo.

Formas simplificadas
A forma não conforma os elementos a uma vontade exterior a eles, o mundo já exagera nisso. Generosa e altiva, ela agrupa as faixas coloridas buscando a maior versatilidade relacional entre elas. Como se essas formas simplificadas pudessem se mostrar menos pálidas, em facetas antes recalcadas.
Talvez por insistir em explorar os mesmos procedimentos ou pelo grau de impessoalidade e de não artístico que existe em suas pinturas, essa obra por vezes é vista como fria e repetitiva.
O retrospecto das pinturas presente na monografia sobre o artista, "Cassio Michalany - Pinturas", publicada pela Cosac & Naify, bem como o texto de Rodrigo Naves que a acompanha parecem indicar o contrário.
Ao longo do tempo, o pintor foi desdobrando o seu procedimento. Passava de uma faixa de cor a outra como se procurasse uma outra ordem das coisas. Existe algo de permutação, de um jogo livre entre as faixas.
Mas o é com muito rigor, as cores certas procuram maneiras mais prazerosas de se acertar.
O ensaio de Rodrigo Naves nos ensina que o artista se detém sobre esse "esquema" buscando reverter "a serialização que comanda os nossos dias".

Cores autônomas
O curioso é que, com o passar dos anos, as cores de Michalany apareceram mais autônomas. Na análise de Naves das obras de 1979 a cor é empenhada em um projeto de harmonização além dela.
Nos últimos quadros, as cores se arranjam respeitando os limites umas das outras, com tolerância e vontade de encontrar formas de se relacionar em que nossas vontades apareçam menos avulsas. Decerto estamos em uma outra etapa histórica. Essa relação é esmiuçada de maneira exemplar no ensaio.
O pintor tem algo do que o poeta Baudelaire viu em Constantin Guys como o pintor da vida moderna: uma disposição para encontrar alegrias possíveis e a força potencial de um mundo novo que nos surge e ao mesmo tempo assusta e fascina.


Cassio Michalany - Pinturas

    
Autores: Rodrigo Naves e Cassio Michalany
Editora: Cosac & Naify (tel. 0/xx/11/255-8808)
Quanto: R$ 92 (82 págs.)




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