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Fernanda Montenegro toca a "vida de vestibular"
DA REPORTAGEM LOCAL
Dama absoluta do teatro brasileiro, indicada ao Oscar por seu
desempenho no cinema -"Central do Brasil", de Walter Salles,
1998, com o qual venceu o Urso de
Prata em Berlim, a atriz Fernanda
Montenegro, 74, não teme marinheiros de primeira viagem.
"Redentor", dirigido por seu filho Cláudio Torres, é o terceiro filme de um diretor estreante a ser
lançado neste ano com seu nome
no elenco. Antes vieram "O Outro
Lado da Rua" (Marcos Bernstein)
e "Olga" (Jayme Monjardim).
Fernanda diz que "não há diferença entre o "diretorzão" e a "atrizona" ou o diretor de primeiro filme e o ator não-experimentado",
simplesmente porque "tudo é tão
sempre novo, cada coisa que você
faz parte absolutamente do zero".
A afirmação não é recurso de
modéstia de quem se sabe grande,
mas convicção de uma atriz que
encara o seu ofício como "uma vida de vestibular: você tem sempre
que se aprofundar numa matéria
e prestar um exame a si mesmo e a
terceiros".
Na própria carreira, Fernanda
imaginou que faria provas apenas
eventuais no cinema, onde há o
pedestal "para aquela senhora câmera, aquela coisa que é amada,
alisada, limpada, medida e para a
qual você não blefa, porque ela te
flagra em desníveis, em desvelos,
em acertos também".
A atriz enxergava no teatro o
seu território por excelência.
"Sempre achei que eu era uma
atriz de teatro, só de teatro, com
visitações esparsas em cinema".
Mas quis a história da atividade
artística no Brasil que fosse este
um momento em que "o cinema
está vivo, diversificado, com uma
pujança que talvez somente a
dança tenha igual". E a atriz intensificou suas visitações a esta arte.
Com o genro Andrucha Waddington ela acaba de filmar "Casa
de Areia", em que divide o set e o
personagem (que atravessa um
salto temporal) com a filha Fernanda Torres. "Vão dizer: "Ué, é
tudo em família?!", conjectura a
atriz. "E por que não? Onde está
escrito que família não pode trabalhar junto em alguma coisa?
Não existe compêndio sobre isso", responde a si mesma.
No domínio dos compêndios
não-escritos, além da criatividade
cultivada no âmbito familiar, há
também dupla atuação de artistas
que migram para a gestão pública. Mas dessa experiência a atriz
declinou, quando foi convidada a
assumir o Ministério da Cultura.
"Isso foi há 20 anos", ri, e explica
a recusa: "Não tenho nada a ver
com essa coisa de administrar
uma vida política. Eu seria um pudim de festa, um nada. Na primeira hora que tivessem proibido "Je
Vous Salue, Marie" [filme de
Jean-Luc Godard censurado no
Brasil em 1985] eu já largaria o
cargo e iria embora para casa. Não
teria a sofisticação, ou a paciência,
ou o talento e a vocação para, sobre esse fenômeno da proibição,
conversar, tentar liberar".
Nisso, o músico e atual ministro
da Cultura Gilberto Gil é "o contrário" de Fernanda, avalia a atriz:
"Acho que ele está sabendo fazer
isso. É um homem corajoso, responsável. Não é um alienado. Se
aceitou [o ministério], é porque
quer ter presença e voz como homem político".
(SA)
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