São Paulo, sexta-feira, 10 de junho de 2005

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"DJOMEH"

Iraniano cria geografia existencial

PAULO SANTOS LIMA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

A geografia é uma questão no cinema iraniano. Seja a mais física, ou temática, como em "Tempo de Embebedar Cavalos", de Bahman Ghobadi, seja a dos filmes onde o espaço está a serviço da mise-en-scène, com os personagens percorrendo em tempo real geografias filmadas, jamais citadas. É o cinema do espaço-tempo de Abbas Kiarostami.
"Djomeh", de Hassan Yektapanah, fica no meio do caminho, talvez mais para Ghobadi, que também não nega os planos longos, mas olhando certamente para o gênio de Kiarostami, que foi seu mestre em "Gosto de Cereja", no qual Yektapanah trabalhou como diretor-assistente.
Tal herança polui um pouco o fluxo de imagens que narra a aventura romântica do imigrante Djomeh no Irã. Porque discutir a imagem não parece a praia de Yektapanah, o que fica claro em tomadas mais longas ou conceituais, como a da chaleira que faz a água escorrer pela parede e a do sol passando pelo buraco do balde. Quando a câmera se preocupa menos em fazer uma poesia visual a que seu diretor não é lá muito capaz, o longa-metragem segue bem o seu caminho.
Sem o esmero visual, fica a história de Djomeh, que sai do Afeganistão simplesmente porque agrediu um dogma ao se apaixonar por viúva mais velha. Agredirá outro no Irã, ao se apaixonar pela filha de um comerciante. Quer pedir a mão da moça e, para tal, pede ajuda ao chefe iraniano, Mahmoud, que, aliás, o entende melhor que seu colega afegão. Ele nem quer retornar ao seu país, sabedor de que a família jamais o compreenderá.
Interessante como este filme vai de encontro ao discurso mofado de um "Exílios", de Tony Gatlif, por exemplo, onde a origem é a meta para o casal se encaixar no mundo. Djomeh, ao contrário, tenta um encaixe por onde estiver, via afeto humano, além das fronteiras e tradições locais e fiel a uma globalização nada retórica. Daí que "Djomeh" cria um novo viés no cinema iraniano, o da geografia existencial.


Djomeh
Djomeh
   
Direção: Hassan Yektapanah
Produção: Irã, 2002
Com: Jalil Nazari, Mahmoud Behraznia, Mahbobeh Khalili
Quando: a partir de hoje no Frei Caneca Unibanco Arteplex


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