São Paulo, sexta, 10 de julho de 1998

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TEATRO
Frateschi vive a geração do meio

da Reportagem Local

Celso Frateschi, 46, começou a fazer teatro muito jovem, no Arena, com Augusto Boal. Na peça, ele é Trigorin, escritor de uma geração intermediária entre os velhos Arkádina e Sorin e os jovens Treplev e Nina. É um autor de talento. Mas não é, como diz na peça, um Tolstói.
(NELSON DE SÁ)

Folha - Como você está erguendo o Trigorin, e quais são as relações entre o ator e o personagem?
Celso Frateschi -
A gente tem três gerações muito definidas na nossa versão, e eu fico no meio termo também. O Trigorin fica também entre as gerações e procura acontecer, enquanto geração, enquanto artista. A Daniela buscou alguma identidade conceitual entre ator e personagem e foi muito legal. Em princípio, eu não tenho nenhuma identidade com o Trigorin, mas ele, como todos os grandes personagens, acaba mexendo com a gente. É um personagem que, quase pelo antimodelo, faz você refletir o tempo inteiro. Você se sente transformado por esse personagem.
Folha - São escolas muito diferentes, no elenco.
Frateschi -
Muito diferentes. E a Daniela conseguiu dar espaço para que elas se manifestassem. Ela deu todo o espaço para eu trabalhar construtivamente, como é o meu jeito. Quer dizer, uma coisa brechtiana, no sentido do método e não tanto da postura. O personagem vai sendo moldado passo a passo, lentamente, a emoção surge de uma maneira diferente. Foi o grande barato desse trabalho. E isso de alguma maneira deve estar expresso no espetáculo. A gente não sabe direito como.
Folha - Você vem de um teatro politizado, na periferia, em sindicato. Ao mesmo tempo, é um ator de muito refinamento.
Frateschi -
O teatro que a gente fez não era panfletário. Sempre teve uma direção mais brechtiana do que piscatoriana. Mais no sentido de apresentar antimodelos que podem sugerir um raciocínio e não um ato de certeza. A gente ia provocando. E, quando eu resolvi encarar a profissão, o primeiro grande espetáculo que eu fiz foi o "Hamlet". Aí não dá para não se refinar (ri). Você faz uma temporada de um ano como Hamlet e não tem como não elaborar todas as dúvidas que vinham sendo acumuladas.
Folha - Trigorin é um espelho do Cláudio, o tio de Hamlet.
Frateschi -
É, a cena do teatro tem uma referência direta. Mas o Tchecov é muito legal porque ele é o rei das pistas falsas. Ela coloca muitas possibilidades. A grande dificuldade é que não tem rubrica nenhuma e tem pausas (ri). É um sufoco para ter uma lógica. E essa é uma das pistas, a relação hamletiana. No caso da peça-dentro-da-peça, ela é armada para ser a do "Hamlet", mas acaba sendo como a dos artesãos do "Sonho de uma Noite de Verão", que apresentam com a maior boa vontade, e a nobreza tira o maior sarro deles.



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