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Seguranças ensinam e contêm visitantes
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Eles aparecem do nada quando
você está fazendo algo errado. Na
Bienal, por exemplo, não é permitido encostar os cotovelos no
guarda-corpo central dos andares
superiores. Basta ameaçar uma
inclinação para que um dos
"men-in-black" lhe proíba, educadamente, a posição de descanso. "É perigoso", alertam.
Com a mesma frase, Antônio,
um dos seguranças da exposição,
dá a sua versão da relação público-vigilante. Perigoso, para ele, é
trabalhar na Bienal: "As obras são
valiosas. Já picharam, estragaram
peças. Com um deslize nosso, tem
gente fazendo coisa errada".
O "mau comportamento" do
público, segundo Antônio, freqüentemente atinge uma das peças reunidas por Mark Dion no
projeto "A Expedição Brasileira
de Thomas Ender - Reconsiderada". Na sala, há armários de vidro
pintados por fora. A pintura pode
ser descascada para que o visitante veja animais empalhados no interior desses armários.
Só que começaram a rabiscar
demais, segundo seguranças. As
rasuras trazem nomes, desenhos
e símbolos fálicos. Até que a organização da Bienal proibiu a interação, com o aval de Dion. "Mesmo assim, vem gente aqui que rabisca escondido", diz Antônio.
Em geral cordiais, os seguranças
não são de falar muito. A regra é
chamar um monitor se alguém fizer perguntas sobre as obras. Só
às vezes o protocolo é quebrado.
Antônio, por exemplo, teve que
fazer sua intervenção quando ouviu um visitante explicar a outro
que o pó que aparece na fotografia que faz parte da instalação do
chinês Xu Bing era cocaína.
Sem um monitor à mão, Antônio explicou que o pó foi retirado
dos escombros do World Trade
Center após o 11 de Setembro. "A
gente olha as obras o dia inteiro e
ouve as explicações dos monitores. Já sei muito sobre elas."
Victor também tem sua explicação. Para ele, "alguns visitantes
acham que arte contemporânea é
qualquer coisa e que você pode fazer o que quiser com ela". A observação reflete uma situação cômica que ocorreu dentro da instalação que reproduz o ateliê do
pernambucano Paulo Bruscky,
transportado para a Bienal.
Em um dos cômodos, há uma
mala com documentos e escrituras. Uma jovem visitante, sem
qualquer cerimônia, apanhou a
mala, que estava protegida por
uma vitrine, e saiu andando com
ela pela Bienal. "Eu fui atrás dela e
peguei o trabalho de volta. Foi aí
que ela me mostrou o que estava
escrito na peça", conta Victor.
Na parte superior do trabalho
há uma etiqueta onde está escrito
que qualquer pessoa pode apanhar a mala, transportá-la para algum lugar e abandoná-la, para
que outra pessoa, ao ler a mesma
etiqueta, tome a mesma atitude. A
curadoria da Bienal, no entanto,
não quer que nenhum objeto do
ateliê de Bruscky saia de seu lugar.
Outras histórias divertem os integrantes da equipe de seguranças, que foi reforçada depois da
pichação das obras do cubano
Jorge Pardo e do britânico Mike
Nelson -antes eram 60 vigilantes, agora são cem. "Um colega
me disse que já teve até que segurar a onda de um casal que estava
se pegando em uma das salas escuras, onde estão os vídeos", conta um dos seguranças.
(GF)
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