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LITERATURA
Em entrevista, Chuck Palahniuk fala sobre a origem de "Cantiga de Ninar" e as conseqüências de "Clube da Luta"
"Somos apaixonados pelo fim da civilização"
THIAGO NEY
DA REDAÇÃO
A primeira regra para falar com
Chuck Palahniuk é: não fale sobre
Chuck Palahniuk. Pelo menos,
não logo de início.
Autor de "Clube da Luta", o escritor norte-americano gosta de
conversar sobre a quase obsessão
em fazer humor com episódios
trágicos, sobre as referências anticonsumo presentes em suas histórias ou sobre sua escrita enxuta
e direta. Mas fica incomodado
quando se torna o assunto.
Aos 42 anos, Chuck Palahniuk
teve, assim como as tramas de
seus livros, uma vida insólita. Ex-mecânico de caminhões, teve o
pai assassinado com a namorada
pelo ex-marido dela. O acusado
está no corredor da morte. Quando era adolescente, seu avô cometeu suicídio após matar a mulher.
Em entrevista à Folha, por telefone, de sua casa em Portland, no
Oregon, Palahniuk explica por
que recomendou a pena de morte
ao assassino de seu pai e comenta
"Cantiga de Ninar", que acaba de
ser lançado no país (saiu nos EUA
em 2002). No livro, um jornalista
e uma corretora que vende casas
mal-assombradas saem em jornada para destruir os exemplares de
um livro que contêm uma antiga
canção africana que tem o poder
de matar crianças.
Folha - Em entrevista, o sr. disse
que "Cantiga de Ninar" é seu livro
mais impactante. Por quê?
Chuck Palahniuk - Acho que os
signos são mais impactantes, são
horríveis. São simbolizações de
força, de magias, há as crianças
que vão morrendo. É um tipo diferente de impacto daquele de
"Clube da Luta", por exemplo.
Folha - O sr. já comentou que tira
muitas das histórias de seus livros
a partir de experiências próprias.
De onde veio "Cantiga de Ninar"?
Palahniuk - Estava num shopping procurando presente de casamento para um amigo. Uma
amiga, formada em história, começou a discorrer sobre como os
nossos mais fortes e sagrados
símbolos vêm de culturas que foram dominadas pela nossa. E nós
reduzimos esses símbolos a simples objetos de decoração. Então
pensei: "E, se existisse um símbolo poderoso, de um outro povo,
que, não importa o quanto fosse
domesticado e explorado por nós,
mantivesse sua força e continuasse a ter efeito sobre as pessoas?".
Folha - O sr. concorda com a idéia
de que "a civilização precisa ser
destruída para ser salva"?
Palahniuk - É uma fantasia, uma
idéia romântica que as pessoas
têm. Antes da virada do século,
todos estavam preocupados com
o bug do milênio, e acho que isso
se deve ao fato de que as pessoas
são apaixonadas pela idéia de um
fim da civilização, porque isso
possibilitaria um recomeço. E elas
ficaram com o coração partido
porque nada aconteceu. Mas provavelmente todos cometeriam os
mesmos erros se tivessem uma
segunda chance. De certa forma,
meus livros tratam de criar um
modelo de sociedade e fazê-lo
funcionar até quebrar.
Folha - O sr. começou a escrever
após os 30 anos. O que o motivou?
Palahniuk - Só com 31 anos consegui comprar minha casa num
lugar onde não havia TV nem rádio, e eu passava o tempo lendo. E
foi ali que percebi que havia poucos livros que eu realmente gostaria de ler. Se eu não tivesse comprado aquela casa, provavelmente
estaria sentado assistindo à TV.
Folha - "Clube da Luta" foi seu
primeiro livro e tornou-se um fenômeno cultural. Como o sr. vê o livro
hoje? Gosta de falar sobre ele?
Palahniuk - "Clube da Luta"
contém uma grande idéia. Gostaria de tê-lo escrito com mais cuidado, porque nunca esperava que
alguém fosse publicá-lo, então escrevi muito rápido, com muita
energia e raiva... Algumas seqüências estão no livro apenas porque
foram histórias contadas por
meus amigos, e eu havia prometido a eles que seriam incluídas.
Folha - Na época em que seu pai
morreu, o sr. recomendou a pena
de morte para o assassino. O sr. é a
favor desse tipo de punição?
Palahniuk - Para esse homem,
pelos crimes que ele cometeu, sou
a favor. Não serei sempre a favor,
mas nessa circunstância, sim.
Folha - Aqui no Brasil, há alguns
anos, um homem entrou num cinema e atirou em várias pessoas, durante uma sessão de "Clube da Luta". Depois ele disse que adorava o
filme. O sr. soube do caso? Como lidar com esse tipo de coisa?
Palahniuk - Não sabia. Quando
escrevia "Clube da Luta", contei a
amigos sobre algumas idéias, como a de garçons que urinam na
comida ou de projecionistas inserindo imagens pornográficas em
filmes "familiares". Um amigo
disse para eu não escrever isso,
pois poderiam imitar. Mas, assim
que o livro saiu, centenas de pessoas me disseram: "Adorei a história. Sou um garçom e urino na
comida muitas vezes". Acho que
você pode retratar essas coisas, rir
delas e, assim, tira o poder delas.
Daí as pessoas vão desistir de fazer isso. Sempre haverá pessoas
loucas, e você pode ou reagir com
horror, o que lhes dará mais poder, ou rir antes disso acontecer,
para que as pessoas sejam menos
atraídas em fazê-las acontecer.
CANTIGA DE NINAR. De: Chuck
Palahniuk. Editora: Rocco. Quanto: R$
36,50 (280 págs.).
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