São Paulo, sábado, 11 de junho de 2011

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CRÍTICA ROMANCE

"Hotel Íris" comprova as sólidas qualidades de Yoko Ogawa

JOCA REINERS TERRON
ESPECIAL PARA A FOLHA

O incrível vigor exibido pela ficção japonesa atual ainda não encontrou adeptos no Brasil.
Mesmo Haruki Murakami, cujos livros mais ousados continuam inéditos (fenômeno inverso ao de Portugal - "Crônica do Pássaro de Corda", de 1995, sua obra-prima, saiu por lá em 2006), não repercute o bastante entre leitores brasileiros (algo parecido não ocorre entre leitores hispano-americanos e franceses, por exemplo).
É um mistério à altura daquele presente em grande parte dos livros do autor japonês indicado ao Nobel.
Yoko Ogawa, nascida em 1962 e portanto mais jovem do que Murakami (1949), tem encontrado destino internacional semelhante.
Dona de mais de 20 títulos, afinal ela estreia por aqui com "Hotel Íris", romance pelo qual foi finalista do Asian Man Literary Prize em 2010.
A má notícia é que chega traduzida do francês, o que é um retrocesso injustificável para o mercado editorial brasileiro. A boa nova é que Ogawa é uma romancista de qualidades tão sólidas a ponto de sobreviver até a esse tipo de falsificação contrabandeada.

HOTEL
O livro conta a história da jovem Mari, que, aos 17 anos, auxilia sua mãe no hotel que dá nome ao livro.
Certa noite ocorre um escândalo, e uma prostituta sai do quarto no qual se hospedava aos prantos e em mau estado.
As acusações da prostituta, em meio a imprecações e arremessos de objetos, são dirigidas ao homem que permanece em silêncio no apartamento.
A expectativa por um desenlace de Mari é atendida pela voz madura de um homem a ordenar à prostituta que se cale. Ela se surpreende ao descobrir que o alvo dos palavrões é um ancião.
Passam-se alguns dias, e então Mari reencontra o velho (um tradutor do russo) na rua e eles travam conversa.
Depois disso o tradutor passa a lhe escrever. E a adolescente -que antes não recebia atenção de quase ninguém- cai na arapuca. Diante da perversidade sexual do velho ela se entrega com comovente devoção. Mas afinal quem é que se entrega a quem?

SUBLIME
Tem início então um jogo de contrastes entre sentimentos baixos e o sublime: "Sua brutalidade não o tinha feito perder nada de sua elegância, e ele era dono de tamanha distinção que me cobria de vergonha. Ele me desnudava como um perfumista desfolha uma rosa, como um joalheiro força a abertura de uma ostra para ali buscar uma joia".
Em espetacular volta de parafuso, Yoko Ogawa fornece ao leitor vislumbres do lado oposto do paraíso por meio de Mari, uma versão feminina e complementar (pois masoquista) do protagonista de "Amor Insensato", clássico de 1924 de Junichiro Tanizaki (1886-1965) no qual um homem velho é humilhado pela submissão a uma lolita.


JOCA REINERS TERRON é autor de "Do Fundo do Poço Se Vê a Lua" (Companhia das Letras)

HOTEL ÍRIS

AUTOR Yoko Ogawa
EDITORA Leya
TRADUÇÃO Marly Peres
QUANTO R$ 34,90 (208 págs.)
AVALIAÇÃO bom


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