|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Originais que caíram em boas mãos
especial para a Folha
Aconteceu com Mirisola o que
havia acontecido, há dois anos,
com Paulo Lins ("Cidade de
Deus"): os originais do primeiro
livro caíram em boas mãos.
No caso de Lins, caíram nas do
crítico dos críticos acadêmicos,
Roberto Schwarz, e ele recebeu
um empurrão hábil, foi editado
pela Companhia das Letras e teve
sua literatura bem acolhida.
Mirisola, um escritor persistente, enviou seu livro para o crítico
dos jovens críticos, Marcelo Coelho. Era mais um entre tantos que
Coelho recebe. Ficou encostado
até a psicanalista Maria Rita Kehl,
mulher de Coelho, encontrá-lo casualmente. Kehl indicou a editora,
prefaciou o livro, e Coelho "lançou-o" em sua coluna semanal
desta Ilustrada. Feito.
Faço, aqui, um cruzamento entre as obras de Lins e Mirisola.
Ambos se apóiam num estilo perturbado, rápido, acumulador de
imagens, para contar suas histórias. Engano. Lins conta uma história e tanto, já que cresceu na
quase-favela carioca Cidade de
Deus e viu três gerações de malandragem se sucederem e se suicidarem.
Mirisola não conta história alguma. É o que ele diz, é o que aparenta. Mirisola fala dele mesmo e escreve cartas sobre ele mesmo. O
que dá uma tremenda história.
Curioso como Coelho, o jornalista (profissão "dinâmica"), acata os reflexos de um não-contador
de história, e Schwarz, o acadêmico (profissão "reflexiva"), se deixa envolver pelos pesadelos do
tráfico carioca. Mas isso é outro
papo.
Mas, espere um pouco. Tenho
outra historinha para contar.
Também recebo originais. Também um escritor inédito me seduziu. Luis Dolhnikoff, seu nome.
Também indiquei editoras e citei-o em colunas. Foi recusado e
editou por conta o de tirar o fôlego
livro "Os Homens de Ferro".
Dolhnikoff é um daqueles escritores que a gente, escritores, gostaria
que não tivesse nascido, pois é, ou
consideramos, infinitamente melhor que nós, o que acarreta crises
de criação.
Mas Dolhnikoff entregou seus
originais para a pessoa errada, outro escritor, eu. Deveria ter entregue a um crítico. Continua semi-inédito, sem a sorte de Lins e Mirisola. Moral da história: escritor
inédito, incansável, insista não
com seus pares, mas com críticos,
e boa sorte. Ninguém leva um escritor a sério. Já os críticos...
(MRP)
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
|