São Paulo, Quarta-feira, 12 de Maio de 1999
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CINEMA
"Urbânia", de Flavio Frederico, mostra deterioração da cidade na visão de duas pessoas que percorrem as ruas em um Dodge
Estreante faz "street movie" sobre SP

Rafael Assef/Divulgação
Filmagem de cena do primeiro longa-metragem de Flavio Frederico em SP


JOSÉ GERALDO COUTO
da Equipe de Articulistas

Mais um talento brasileiro do curta-metragem chega a seu primeiro longa. Desta vez é Flavio Frederico, 29, realizador dos premiados curtas "Todo Dia Todo" (1998), de ficção, e "Copacabana" (1999), documentário.
"Urbânia", que Frederico acaba de rodar em São Paulo, é um projeto híbrido e insólito: do mesmo material filmado o diretor pretende extrair um longa de ficção e um curta documental.
No longa, os atores Turibio Ruiz e Adriano Stuart interpretam, respectivamente, um velho cego que retorna à cidade depois de 40 anos, e um amigo que lhe serve de motorista em sua jornada.
"É um "street movie" sobre a deterioração da cidade", define Flavio Frederico. "Os dois personagens percorrem as ruas num velho Dodge em busca de lugares que conheceram no passado e só encontram decadência."
O próprio longa tem um lado documental, segundo o diretor. "As situações criadas pelos dois personagens ensejam "balões" documentais. Por exemplo, os dois puxam conversa com o dono de um bar, de repente este começa a dar um depoimento, e a gente percebe que ele não é um personagem, mas um dono de bar de verdade."
O curta, por sua vez, será concentrado nesses depoimentos reais, entrelaçados com material de arquivo e imagens atuais dos lugares em questão.
Frederico está filmando principalmente em bairros paulistanos tradicionais que se tornaram decadentes, como os Campos Elíseos e o Bom Retiro, além do centro da cidade.
"Minha preocupação maior é com a linguagem", diz o diretor. "Vi recentemente trabalhos interessantes que misturam ficção e documentário, como o iraniano "A Maçã" e o americano "Slam", premiado no Sundance, sobre os improvisos no "rap" de rua."
Frederico ainda não viu "Iracema" (1974), de Jorge Bodansky, marco brasileiro do cinema que mistura documento e ficção.
Em "Urbânia" as cenas diurnas estão sendo filmadas em super-16 milímetros, e as noturnas (30% do filme) em vídeo digital. Estas últimas serão depois "kinescopadas" (transferidas para película).
Além da economia -o orçamento total do longa é de apenas R$ 500 mil-, a opção pelo vídeo tem uma justificativa estética, segundo Frederico.
"À noite, o personagem do Adriano Stuart dá seu grito de liberdade e "toma o poder" no filme. Ele larga o velho num hotel e vai para a putaria. Seu mundo é o das boates e inferninhos, cheio de luzes e cores, o que implica uma imagem mais "suja"."
Na semana passada, o diretor soube que seu filme foi selecionado pelo Hupert Bauls Fund -fundo de financiamento ligado ao Festival de Roterdã- e receberá um aporte financeiro de 40 mil florins (cerca de R$ 43 mil).
Além de ajudar na finalização do filme, a seleção pelo Hupert Bauls torna-o tecnicamente uma co-produção internacional e garante sua distribuição no Benelux (Bélgica, Holanda e Luxemburgo).
Flavio Frederico já está se acostumando aos prêmios e aos festivais internacionais.
Seu "Todo Dia Todo" -que narra toda a vida de um homem num único plano-sequência- foi premiado nos festivais de San Francisco (melhor curta narrativo) e Bilbao (melhor curta ibero-americano), além de ter sido selecionado para o Sundance, Roterdã e Biarritz.
No Brasil, "Todo Dia Todo" ganhou os principais prêmios da última Jornada de Cinema da Bahia.
O documentário "Copacabana" -que mostra o último dia do ano na mais famosa praia do Rio- só participou, até agora, do Festival de Documentários "É Tudo Verdade". Faturou o troféu de melhor filme conferido pela Associação Brasileira de Documentaristas.


O colunista José Simão está em férias.


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