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crítica
"Festa" é início
promissor de
Nachtergaele
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
"A Festa da Menina Morta" é
um filme até
certo ponto desconcertante pela ficção que envolve:
uma cidade ribeirinha do
Amazonas promove a santo um jovem após ele receber de um cachorro o vestido rasgado de uma menina desaparecida.
Certas coisas são animadoras nessa estreia, desde
a visada sobre o misticismo até a observação detida da vida de um lugarejo
ilhado. Uma população fora do espaço e do tempo,
onde se encontram referências de "ir a Manaus",
como quem busca perspectiva dentro da realidade. Porque uma das virtudes do filme talvez seja essa: levar o espectador a se
perguntar todo o tempo
sobre o que, de fato, está
vendo: qual o sentido das
imagens? Matheus Nachtergaele não permite ao
sentido repousar alegremente nas coisas filmadas.
O mundo que se vê é um
mistério porque o mundo
é um mistério. Por exemplo: a essa festa razoavelmente macabra podemos
apor umas tantas dúvidas.
Se a menina morta continuou morta, qual o milagre de Santinho? O que se
impõe é a necessidade de a
população vivenciar um
acontecimento superior,
que dê conta da existência
de Deus, de sua presença
entre os homens. Santinho cumpre a função, por
mais frágil que seja a história da menina -ou justamente por isso: quanto
mais frágil, mais evidente
é a necessidade da crença.
O segundo aspecto desconcertante é menos animador. Vendo o filme se
tem a impressão de reencontrar a estética do cinema novo, a ideia de um
"Brasil autêntico" que se
buscava nos anos 60. Nada
contra isso, que de certa
forma já teve seu tempo, o
que se reflete numa falta
de força maior de boa parte das imagens.
Não reforça o filme, até
onde pude entender, a relação incestuosa pai-filho.
Ela não parece motivada o
bastante para existir. Não
é questão de moral, mas de
construção, algo não muito bem colocado nesta estreia promissora de Nachtergaele como diretor.
Avaliação: bom
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