São Paulo, sábado, 13 de junho de 1998

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CINEMA
"Remake" de "Disque M para Matar" estréia nos EUA; recriações de "Psicose" e "Janela Indiscreta" estão a caminho
Refilmagem de Hitchcock honra o original

AMIR LABAKI
de Nova York

Hitchcock voltou. Um ano antes das celebrações do centenário de seu nascimento, três refilmagens preparam a festa. A primeira estreou há uma semana, com boa bilheteria: "A Perfect Murder" (Um Assassinato Perfeito), dirigido por Andrew Davis (O Fugitivo), revisita "Disque M Para Matar" (1954). A caminho, estão o "remake" de "Psicose", sob a batuta de Gus van Sant, e o de "Janela Indiscreta", que o tetraplégico Christopher Reeve promete dirigir e estrelar.
Os nostálgicos que me perdoem, mas "A Perfect Murder" é dessas raras refilmagens que honram o original. O roteiro de Patrick Smith Kelly expande para a permissiva Manhattan do final dos anos 90 a trama adúltero-criminal escrita por Frederick Knott para os palcos da "pré-swinging" Londres dos anos 50.
Na primeira versão cinematográfica, que Knott adaptou para a direção de Hitchcock, a teatralidade era evidente, assim como os estreitos limites morais do que poderia ser mostrado. Os tempos são outros. Sexo e violência explicitaram-se nas telas. O "remake" de Davis-Kelly não se limita a aproveitar dessa maior liberdade.
Em "Disque M para Matar", um escritor americano (Robert Cummings) destrói o equilíbrio de um casal londrino de classe média (Ray Milland e Grace Kelly) ao se envolver com ela. É mais por orgulho ferido do que por cobiça que Milland contrata um pequeno vigarista para liquidar a esposa.
"A Perfect Murder" transfere o enredo para endereços poderosos de Nova York. Uma mansão na Quinta Avenida, um escritório em Wall Street, a ONU e o museu Metropolitan fazem o habitat do casal Steven e Emily Taylor (Michael Douglas e Gwyneth Paltrow).
O Steven de Douglas é um personagem pós-crise das bolsas asiáticas. A falência de seu casamento é fichinha perto do desastre financeiro. Assim, ao descobrir que o amante da esposa (Viggo Mortensen) disfarça-se de pintor perturbado mas não passa de um golpista de extensa ficha criminal, Steven fecha o melhor negócio do ano ao contratá-lo para matar Emily.
Passaram-se 40 anos entre as duas versões e a dupla Davis-Kelly assina uma evidente fábula moral sobre o triunfo do capitalismo nesse período. Mais do que nunca, é "money, money, money, money" que faz o mundo girar.
São todos egocêntricos e ultra-individualistas em "A Perfect Murder", mesmo que uma sequência de delegacia procure suavizar um pouco Emily. Até o amante vira vilão (secundário) como que dizendo: nem o adultério pode ser levado a sério. Lá em cima, um perplexo Hitchcock deve estar se embriagando, abraçado a um desolado Nelson Rodrigues.



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