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Crítica/"Oscar Niemeyer"
Livro revê a heróica arquitetura brasileira
LUIZ RECAMÁN
ESPECIAL PARA A FOLHA
O Brasil está avaliando o
Brasil. Desenvolvimento, industrialização, modernização social, federação, república são temas que
rondam as mesas de debates. A
partir de vários ângulos e interesses, discute-se propriamente o Brasil moderno, um mais
ou menos reconhecível projeto
que ocupou considerável parcela do século que já se foi. Poucas conclusões, muito desentendimento e alguma perplexidade parecem constatar que o
desenvolvimentismo -responsável pelo salto industrializador mas também pela iniqüidade social massificada- não
conseguiu alavancar o país em
direção ao progresso econômico, muito menos social.
Enfraquecem as possibilidades reais de desenvolvimento e
esvanecem nossas representações coletivas catalisadoras de
modernização. Mas algo torna
bem específico aquela que, contraditoriamente, mais diretamente esteve associada à aspiração moderna nacional e às estratégias de sua planificação.
A obra de Niemeyer é um nó
górdio da cultura moderna no
Brasil. Ultrapassa-o à medida
que, superlativa, parece tomar
rumo próprio. Enquanto isso,
nossas formas culturais mais
originais põem em marcha o
anunciado "bye, bye, Brasil",
segundo consta, da canção.
Mas o que se passou com a
obra desse brasileiro, "o arquiteto com maior número de
obras importantes na história
da humanidade"? Com certeza
sua longevidade e produção ultrapassam aquilo de que foi o
mais ilustre construtor, a "arquitetura moderna brasileira".
Como explicar tanto êxito se o
material social a que veio dar
ossatura desapareceu?
O mais novo volume da coleção Folha Explica, "Oscar Niemeyer", de Ricardo Ohtake,
procura explicar tal prodígio
repassando tópicos da heróica
história da arquitetura brasileira que, sinal dos tempos, nem
se distinguem mais claramente
das interjeições de admiração.
A rapidez e imprecisão dos
relatos, digamos, "históricos",
dão lugar, na necessária exigüidade e comunicabilidade do
texto, a descrições interessadas
de algumas obras. Proporções,
jogos volumétricos e soluções
estruturais intercalam-se a observações sobre o caráter público das obras e as preocupações
sociais de seu autor. O "barroquismo" -que fincava pé na
tradição brasileira e naturalizava a solução moderna- cede
progressivamente lugar à beleza universal em estado puro.
Essa arquitetura não entrou
em crise existencial, dispensou
sua nave-mãe.
Mas é claro que as coisas não
se passam dessa maneira. E os
leitores ficam sem qualquer indicação para deslindar o paradoxo: o caráter socializante das
formas e espaços criados por
Niemeyer (uma "utopia", segundo o autor) e a sociedade injusta (a "realidade", segundo o
autor) que, de maneira cada vez
mais intensa, viabiliza e propulsiona essa excepcional produção. Não que coubesse a um
texto com outras finalidades
resolver essa equação, mas, ao
reforçar essa disjunção, recorrente na crítica, evidencia a fragilidade dos discursos.
Tanto as condições históricas em que funcionou essa
equação moderna como sua
operação pela sociedade brasileira estão inscritas nessa obra
e em sua magnitude. Os adjetivos de sempre, mais entusiasmados pelo momento comemorativo, nos afastam da verdadeira importância da obra de
Niemeyer, que levará ainda algum tempo até ser decifrada.
LUIZ RECAMÁN é professor do Departamento
de Arquitetura e Urbanismo na USP, em São
Carlos, e da PUC Campinas. É co-autor de "Arquitetura Moderna Brasileira" (Phaidon)
OSCAR NIEMEYER
Autor: Ricardo Ohtake
Editora: Publifolha
Quanto: R$ 17,90 (112 págs.)
Avaliação: regular
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