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Atala quer um restaurante "brasileirão"
O mais reconhecido chef do país, que fez fama no D.O.M., pretende usar referências da cozinha colonial em nova casa
Em defesa da cozinha convivial, peças serão levadas inteiras à mesa; francês Alain Poletto cuidará da cozinha
JANAINA FIDALGO
DA REPORTAGEM LOCAL
Uma conversa entre vizinhos
deu o pontapé inicial neste que
desponta como um projeto ambicioso, na melhor acepção da
palavra, de Alex Atala: um restaurante "brasileirão" que remete à cozinha colonial.
"Está na hora. Este restaurante tem de ser brasileiro. Não
tem nome, não tem nada pronto, a não ser uma idéia", diz
Alex Atala, 39, chef do D.O.M.,
que apareceu no último ano na
lista da revista britânica "Restaurant" como um dos 50 melhores restaurantes do mundo.
Ao mesmo tempo em que vê
na diversidade gastronômica
uma das maiores forças de São
Paulo ("É incrível poder almoçar macarrão e jantar sushi"),
Atala diz sentir falta de "um
brasileirão, um lugar grande e
bacana tratando cozinha brasileira como tem de ser tratada".
"Eu acho incrível uma cidade
como São Paulo ter grandes
restaurantes italianos, japoneses, franceses e churrascarias e
não ter um brasileiro de verdade", afirma Atala. "Tem o Tordesilhas, e eu ajoelho para a
Mara Salles. Tem o Brasil a
Gosto, que eu acho incrível. A
Ana Luiza [Trajano] é uma menina doce, o trabalho de pesquisa dela é irretocável. A comida é boa, mas, ainda assim, não
estamos tratando de um grande restaurante de comida brasileira. Sou fã das duas, mas não
dá para comparar ao Fasano, ao
Figueira [Rubaiyat], ao Shintori, a restaurantes suntuosos."
Um lugar de convivas
A menos de 50 metros do
D.O.M, na esquina das ruas Barão de Capanema e Padre João
Manuel, a nova casa vai ser instalada no prédio antes ocupado
pela rotisserie Paola di Verona
e pelo La Taverna. As obras começam em março, e a inauguração está prevista para junho.
Da ambientação ao cardápio,
tudo deve ter uma unidade que
aluda à época do Brasil colônia,
a começar pelo modo de servir:
levar à mesa um peixe, um frango ou um porquinho... inteiro.
"Devem aparecer receitas
efetivamente brasileiras, como,
por exemplo, um lombinho de
porco inteiro, como a gente faz
em casa; um frango assado inteiro, um leitão à pururuca.
Não estou afirmando que o cardápio vá ser composto disso. É
para dar um exemplo", explica.
"Vamos resgatar a decupagem,
que era aquela coisa de levar a
peça inteira à mesa e fatiá-la na
frente do cliente. O importante
é recuperar esse charme."
Implícito à proposta de oferecer comida como se fazia nos
tempos da colônia, está o conceito do partilhar, de ser mais
conviva e menos cliente.
"Quero que as pessoas divirtam-se mais do que comam, ou
comam enquanto se divertem,
ou divirtam-se enquanto comem, como eram aqueles almoços de fazenda."
A nova casa manterá a estrutura clássica de um restaurante, com maître, sommelier, garçom e commin (ajudante do
garçom), mas incorporará um
um velho personagem da restauração clássica. "Não vou ter
o "captain", que era uma espécie
de mini-maître, mas algo como
tínhamos na época da colonização. Provavelmente, as mesas
serão comandadas por uma senhora típica brasileira, dando-nos uma moringa d'água ou
servindo um pouco de farofa."
Não espere, porém, uma típica casa de fazenda. "Eu tenho
um estilo moderno, seria estranho chegar num lugar com uma
outra cara. Não, não é isso."
A parceria com Poletto
Com aulas em festivais internacionais de gastronomia programadas até o final do ano,
Atala diz que a cozinha já lhe
deu mais do que ele esperava.
"Não imaginei que ia chegar
aqui. Sou um patinho feio, né?",
diz. "Nos últimos anos, tenho
conseguido um bom resultado
profissional e tenho tentado
não desfocar do D.O.M."
Assim, não será Atala, mas o
chef francês Alain Poletto (La
Taverna), quem assumirá a cozinha da nova casa. "Não pretendo trabalhar neste outro
restaurante. Eu sou um artesão
e o D.O.M. é o meu ateliê."
A atual fase de trabalho com
Poletto, que tem acompanhado
a operação do D.O.M. e a quem
Atala não poupa elogios, é definida como uma lua-de-mel.
"Estou não só impressionado
como aprendendo com ele. Estamos muito focados na técnica. O Alain, com o conhecimento que tem da cozinha a vácuo, e
eu, com técnicas complementares à dele, como o cozimento
em baixas temperaturas."
Do aclamar para o afirmar
Num processo que parece
acompanhar a trajetória e o
processo de evolução de Atala
na cozinha, um novo livro está a
caminho para dar, como ele
próprio diz, uma "amarradinha
final".
"É a seqüência natural do
primeiro ["Por Uma Gastronomia Brasileira']. O outro clamava por uma gastronomia brasileira. Este é uma coisa mais
afirmativa, porque já existe
gastronomia brasileira e ela já é
reconhecida pelo mundo."
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