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LIVROS/LANÇAMENTOS
"BIOGRAFIA DE UMA ÁRVORE"
Novos versos do poeta gaúcho compõem quarto capítulo de seu "romance versificado"
Carpinejar acerta as contas com Deus
ROGÉRIO EDUARDO ALVES
DA REDAÇÃO
Os versos de "Biografia de uma
Árvore" buscam acertar as contas
com Deus. Sem transcendência,
as palavras do gaúcho Fabrício
Carpinejar, 29, mergulham no estado vegetal estabelecendo um
contraponto com a superficialidade e espetacularidade do agora.
"Uma árvore biografada é a culminância do anonimato."
Parte quatro de um romance-palimpsesto que vem sendo "descascado" em livros anteriores
-"As Solas do Sol" (98), "Um
Terno de Pássaros ao Sul" (2000)
e "Terceira Sede" (2001)-, esta
apresenta a poesia no que ela tem
de vertebral. Jornalista em São
Leopoldo (RS), Carpinejar conversou com a Folha.
Folha - O poeta ouve a voz de
Deus na "orelha da árvore"?
Fabrício Carpinejar - A poesia é a
orelha da árvore, ouvido do orvalho, audição das vacilações e das
pequenas derrotas. Deus não fala,
o homem povoa seu silêncio e
gasta seu nome para se aliviar do
próprio juízo. Combato a idéia fácil de transcendência na poesia
brasileira. Deus aparece no livro
na segunda pessoa e sempre em
minúscula, no tratamento direto,
com a paridade dos ombros. Ao
cabo, é demitido por justa causa.
Ser demitido é a morte contemporânea e possível de Deus, um
desdobramento da morte descrita
por Nietzsche. Demitir Deus é como tirar sua funcionalidade de
mercado, a produtividade dos
dias, a tutela por nosso destino.
Folha - Qual a função da poesia?
Carpinejar - A função da poesia é
não ter função, é dar prazer. Presta por ser imprestável. Não entendo como escritores ainda a enxergam como uma monarquia e brigam pela realeza, procurando encontrar um sucessor de Drummond, Bandeira e Cabral.
Folha - É possível fazer uma literatura agradável nestes tempos?
Carpinejar - É possível fazer uma
literatura agradável, sem confessionalismo e chantagens, abrindo
as artérias do cotidiano. Nas últimas décadas, a poesia se afastou
do leitor porque ficou todo o tempo poetizando o poema. Acho
que o lirismo brasileiro recebeu
agora alta da metalinguagem excessiva e largou o divã, disposto a
recuperar a fluência das ruas.
Folha - Sua poesia beira a prosa e
às vezes usa essa forma e cria personagens, como num romance.
Carpinejar - Busco uma música
rugosa, áspera, o pensamento da
partitura, composto de pancadas
da consciência. A intenção é fazer
versículos quebrados, uma bíblia
desfalcada. Minhas obras são interligadas como capítulos de um
romance versificado. Vejo a poesia como um ato de raspagem, de
limpeza do palimpsesto. Tudo o
que eu queria dizer estava soterrado na minha estréia.
Folha - Por que o ano de 2045 para situar este livro?
Carpinejar - A data de 2045 segue
os acontecimentos da minha obra
anterior, na qual a velhice é antecipada por medo de o protagonista morrer antes. Em 2045, terei 72
anos. "Biografia" começa na data
de meu aniversário de 73 anos.
Nasci em 72, portanto, trata-se de
um apocalipse íntimo.
BIOGRAFIA DE UMA ÁRVORE. De:
Fabrício Carpinejar. Editora: Escrituras.
Quanto: R$ 17 (104 págs.).
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