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Recife 2005: desculpa aí!
LÚCIO RIBEIRO
COLUNISTA DA FOLHA
Soube através de uma coluna recente de um jornal pernambucano que o mangue bit, a interessante manifestação sonora jovem da
Recife dos anos 90, morreu quando ele ganhou "a equivocada
grande imprensa à caça de novidades", foi além da fronteira, chamou a atenção de gravadoras e virou mangue beat.
O texto, assinado pelo local e
participativo DJ Dolores, vai
além. Diz que a cultura do mangue, a da antena parabólica fincada na lama, ficou com um ar de
nunca ter existido.
Tal discurso, aplicado ao mangue bit ou à qualquer outra manifestação, é o de sempre. De qualquer modo, não quero contribuir
aqui (a tal imprensa equivocada)
para melar nenhuma cena local.
Mas, tão perto tão longe do mangue, a Recife underground que esta coluna visitou recentemente,
entre outras coisas à caça de novidades, já merecia ir além da fronteira, chamar a atenção de gravadoras e virar coisa maior. E viver.
No andar de Mundo Livre, Otto,
Cordel do Fogo Encantado e
Mombojó, respira uma cena rica
que pouco parece com a idéia que
foi dar no mangue bit lá na década
passada. Na definição de Dolores,
que conta que a manifestação
passada foi formada por "jovens
duros, sem muitas perspectivas e
sem internet", a cena local vive
hoje só padecendo do primeiro
mal. Um ativo núcleo de festas,
festivais, revistas, canais independentes de TV, zines, DJs e bandas
boas pegam emprestado o velho e
famoso manifesto de Fred 04
(Mundo Livre) para atualizar a
história de "núcleo de pesquisa e
produção de idéias pop com o objetivo de engendrar um circuito
energético".
Aí você pega o recém-lançado CD
do incrível Chambaril, um projeto de uma dupla de "manipuladores de som" às vezes esticado à
condição de banda, que editou
seu álbum homônimo pelo Bazuka Discos, selo paralelo do coletivo de agitadores Coquetel Molotov, conhecidos por não deixar a
Recife underground descansar.
O CD do Chambaril, guardada
às proporções, lembra "Sobrevivendo no Inferno", do Racionais
MC's, dada a enorme quantidade
de auto-informação misturada a
informações "recebidas", na forma de samplers.
Por exemplo, "Desculpa Aí", a
terceira faixa do disco do Chambaril. Se decupada, tem elementos
de brega regional, rock, hip hop,
batidão funk-miami-bass. Tudo
isso junto, vira bombástico hino
involuntário dessa movimentação recifense e inspiração de título
a esta coluna.
Aí você pega o disco "Brincando
de Punk" (2004), do grupo punk-zoeira The Playboys, que começa
com um sambinha bem tocado,
mas de vocal propositadamente
debilóide. Aí, entra um manifesto
punk-mauricinho contra a cobrança de estacionamento em
shoppings de Recife. A banda assume uma "estética maluca" e, dizem, protagoniza shows insanos.
Para completar a bagunça, fazem
show beneficente em hospital psiquiátrico. O CD traz uma faixa-bônus de "Pessoas Cult", música
que já está no disco. É uma bossa
nova, que na letra diz "Chico,
Caetano, Gil e Gal, compõem meu
gosto musical". Malucos.
Aí, você pega o Rádio de Outono,
banda que se declara influenciada
tanto por Pixies como pela Turma
da Mônica. Se eu disser que isso
resulta em rock sem guitarras, você acredita? O primeiro disco deles acabou de sair. E a banda foi
atração no Curitiba Rock Festival
e fez giro em SP. Se cuida, Pato Fu.
@ - lucio@uol.com.br
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