São Paulo, sexta-feira, 14 de outubro de 2005

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Recife 2005: desculpa aí!

LÚCIO RIBEIRO
COLUNISTA DA FOLHA

Soube através de uma coluna recente de um jornal pernambucano que o mangue bit, a interessante manifestação sonora jovem da Recife dos anos 90, morreu quando ele ganhou "a equivocada grande imprensa à caça de novidades", foi além da fronteira, chamou a atenção de gravadoras e virou mangue beat.
O texto, assinado pelo local e participativo DJ Dolores, vai além. Diz que a cultura do mangue, a da antena parabólica fincada na lama, ficou com um ar de nunca ter existido.
Tal discurso, aplicado ao mangue bit ou à qualquer outra manifestação, é o de sempre. De qualquer modo, não quero contribuir aqui (a tal imprensa equivocada) para melar nenhuma cena local. Mas, tão perto tão longe do mangue, a Recife underground que esta coluna visitou recentemente, entre outras coisas à caça de novidades, já merecia ir além da fronteira, chamar a atenção de gravadoras e virar coisa maior. E viver.
No andar de Mundo Livre, Otto, Cordel do Fogo Encantado e Mombojó, respira uma cena rica que pouco parece com a idéia que foi dar no mangue bit lá na década passada. Na definição de Dolores, que conta que a manifestação passada foi formada por "jovens duros, sem muitas perspectivas e sem internet", a cena local vive hoje só padecendo do primeiro mal. Um ativo núcleo de festas, festivais, revistas, canais independentes de TV, zines, DJs e bandas boas pegam emprestado o velho e famoso manifesto de Fred 04 (Mundo Livre) para atualizar a história de "núcleo de pesquisa e produção de idéias pop com o objetivo de engendrar um circuito energético".
  Aí você pega o recém-lançado CD do incrível Chambaril, um projeto de uma dupla de "manipuladores de som" às vezes esticado à condição de banda, que editou seu álbum homônimo pelo Bazuka Discos, selo paralelo do coletivo de agitadores Coquetel Molotov, conhecidos por não deixar a Recife underground descansar.
O CD do Chambaril, guardada às proporções, lembra "Sobrevivendo no Inferno", do Racionais MC's, dada a enorme quantidade de auto-informação misturada a informações "recebidas", na forma de samplers.
Por exemplo, "Desculpa Aí", a terceira faixa do disco do Chambaril. Se decupada, tem elementos de brega regional, rock, hip hop, batidão funk-miami-bass. Tudo isso junto, vira bombástico hino involuntário dessa movimentação recifense e inspiração de título a esta coluna.

 

Aí você pega o disco "Brincando de Punk" (2004), do grupo punk-zoeira The Playboys, que começa com um sambinha bem tocado, mas de vocal propositadamente debilóide. Aí, entra um manifesto punk-mauricinho contra a cobrança de estacionamento em shoppings de Recife. A banda assume uma "estética maluca" e, dizem, protagoniza shows insanos. Para completar a bagunça, fazem show beneficente em hospital psiquiátrico. O CD traz uma faixa-bônus de "Pessoas Cult", música que já está no disco. É uma bossa nova, que na letra diz "Chico, Caetano, Gil e Gal, compõem meu gosto musical". Malucos.
 

Aí, você pega o Rádio de Outono, banda que se declara influenciada tanto por Pixies como pela Turma da Mônica. Se eu disser que isso resulta em rock sem guitarras, você acredita? O primeiro disco deles acabou de sair. E a banda foi atração no Curitiba Rock Festival e fez giro em SP. Se cuida, Pato Fu.

@ - lucio@uol.com.br

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