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ARTES PLÁSTICAS
Capital francesa, onde o modernista morou boa parte da vida, faz maior mostra individual de sua obra
Leveza de Cícero Dias pousa enfim em Paris
CASSIANO ELEK MACHADO
DA REPORTAGEM LOCAL
Marcadas pela leveza dos sonhos, com personagens que flutuam mais soltos que pássaros ou balões, as aquarelas que Cícero
Dias pintou nos anos 20 demoraram décadas, mas aterrissaram
por fim na cidade onde ele viveu a
maior parte da sua vida.
Será aberta hoje, em Paris, a
maior mostra individual do pintor já feita na capital francesa.
Com mais de 70 obras, a mostra
"Les Années 20" reúne o supra-sumo da produção que inscreveu
o nome do artista pernambucano
no cânone do modernismo nacional, do qual Dias foi o último representante vivo.
É um território bem conhecido
do artista, nascido em 1907 e morto em 2003, o que recebe o conjunto de desenhos e pinturas.
A Maison de L'Amerique Latine, sede da mostra, fica no meio
do Boulevard Saint Germain,
bairro boêmio no qual o modernista se enraizou em 1937, quando
deixou o país fugindo do Estado
Novo de Getúlio Vargas.
"Este era o lugar dele", diz a viúva do pintor, Raymonde Dias, por
telefone, de Paris. "Era o bairro
onde ele passou a maior parte da
vida e é onde ele hoje descansa."
Nas mesmas quadras em que
bebeu da vida ao lado do grande
amigo Pablo Picasso estão expostos hoje cartazes que chamam para a mostra de Cícero Dias.
"Colocaram banners com pinturas dele em diversos lugares de
Paris", conta o galerista Waldir Simões de Assis Filho, um dos curadores da exposição, junto com
Raymonde, Sylvia Dias, filha do
artista (e afilhada de Picasso), e o
colecionador Jean Boghichi.
Parte das comemorações do
Ano do Brasil na França, a exposição tem como base a mostra realizada em São Paulo, na Faap, no
ano passado.
Os franceses saíram perdendo,
já que a obra mais conhecida de
Dias, o grandioso painel "Eu Vi o
Mundo... Ele Começava no Recife", não pegou o avião a Paris.
"Não havia espaço adequado no
museu para os 13 metros do painel", explica Assis Filho. Em compensação, a mostra parisiense
tem trabalhos não expostos aqui,
pinçados de coleções francesas,
incluindo a da família do artista.
As obras foram divididas no espaço expositivo por temas, os temas por excelência do primeiro e
grande Cícero Dias.
Em uma sala, ficam obras ancoradas no erotismo, um erotismo
delicado e onírico como todo o
conjunto da exposição. A morte,
também como sonho, ocupa outra das salas, com olhos fechados
pontuando cabeças perdidas dos
corpos. Não muito longe da morte, ficam desenhos da celebração à
vida, casamentos, festanças, sorrisos discretos.
Presente em toda a exposição,
as cores delicadas do verde dos
canaviais e do mar de Boa Viagem
e o azul do começo da noite em
Recife ganham tributo em uma
sala de paisagens pernambucanas
e cariocas, Estado onde ele pintou
boa parte da produção ali exibida.
Embora a aquarela seja dominante, um conjunto de dez telas
apresenta os primeiros passos do
artista com a tinta óleo, que adotaria ao "deixar" o Brasil.
Cícero Dias não "deixou" propriamente o Brasil. E o Brasil não
o deixou, como mostram poemas
reproduzidos nas paredes do museu escritos por admiradores seus
à João Cabral de Melo Neto, Gilberto Freyre e Manuel Bandeira.
O Brasil não o deixou e prepara
sua maior retrospectiva em setembro, no museu Oscar Niemeyer, em Curitiba. "Será Cícero
completo", promete Raymonde.
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