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CINEMA
Após oito anos, o diretor volta a temas políticos com seu terceiro longa, "Cabra-Cega", baseado em depoimentos reais
Toni Venturi retira a venda da ditadura
ISABELLE MOREIRA LIMA
DA REPORTAGEM LOCAL
O regime militar foi, para os
brasileiros, como um jogo de cabra-cega: quem fez a resistência
tentava tatear na escuridão para
chegar ao fim do jogo. Baseado na
metáfora, Toni Venturi dirigiu
seu terceiro longa, "Cabra-Cega",
que estréia hoje em São Paulo,
Rio, Mato Grosso e Brasília.
Tiago (Leonardo Medeiros), o
protagonista, é o personagem a
"usar as vendas". Militante, ferido
a bala em uma emboscada da polícia, se esconde em um apartamento de um bairro de classe média-alta de São Paulo, até que se
recupere e possa voltar a lutar pelo fim da ditadura.
O ano é 1971. A fase de recuperação dura longos meses. O cenário
é quase sempre o mesmo, o apartamento. Durante esse tempo, naquele lugar, Tiago tem contato
apenas com Rosa (Débora Duboc), uma militante de base, com
Mateus (Jonas Bloch), um líder de
guerrilha, e com Pedro (Michel
Bercovitch), arquiteto a quem o
apartamento-esconderijo pertence. Com o passar de rápidos minutos, o espectador vê a paranóia
crescer na cabeça de Tiago, enquanto as relações entre os personagens se deterioram.
E, apesar de não ser um documentário, Venturi seguiu a linha
"é tudo verdade". Usou depoimentos de 11 militantes/guerrilheiros reais para construir o roteiro de "Cabra-Cega". "Entrevistamos 11 ilustres desconhecidos,
com exceção de José Dirceu, que
na época [2002] era presidente do
PT. Hoje, eles são professores, jornalistas, publicitários. Eu fiz uma
pesquisa sobre o cotidiano da
clandestinidade, queria entender
esses jovens idealistas dos anos 60
e 70", conta o diretor. A pesquisa,
filmada, transformou-se no documentário "No Olho do Furacão",
de Venturi e Renato Tapajós, já
exibido na televisão pela Rede
SescSenac.
Os personagens, apesar de livremente inspirados em muitas pessoas reais, tem maior "identificação" com alguns militantes específicos. "Cada um, de alguma forma, representa um microcosmos.
O dirigente principal, o Mateus, é
livremente inspirado no Joaquim
Câmara Ferreira, que foi o líder
do PC do B."
Da mesma maneira, Carlos Eugênio Paz inspirou Tiago. "Ele foi
o único comandante da luta armada brasileira que não caiu, não
foi preso ou torturado."
Já Rosa e Pedro tiveram inspiração mais livre. Enquanto a militante foi baseada em Maria Prestes, mesmo "sem ter nada a ver
com a história de Prestes", Pedro
foi criado com base no "grupo de
arquitetos paulistas que representavam uma grande parcela da população que era simpatizante,
mas que não tinha vocação militar ou não acreditava que aquela
era a melhor saída".
"Cabra-Cega" marca a volta de
Venturi a temas políticos, depois
de "O Velho - A História de Luís
Carlos Prestes" (1997). Sinaliza
também a tendência de filmes
atuais que resgatam a história
brasileira do período do regime
militar. Segundo o diretor, no entanto, o lançamento, quase paralelo ao longa "Quase Dois Irmãos", de Lúcia Murat, foi uma
coincidência. "O que existe hoje
não é por acaso. O Brasil se voltar
a esse período é fundamental para
a gente entender um pouco mais
do país, para entendermos a
questão dos incluídos e dos excluídos", afirma Venturi.
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