São Paulo, sexta-feira, 15 de abril de 2005

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"O SÉTIMO DIA"

Carlos Saura exibe as feridas de uma Espanha cindida em dois

SYLVIA COLOMBO
EDITORA DO FOLHATEEN

Walter Salles encontra Quentin Tarantino.
Ou, ainda, David Carradine, o Bill, de "Kill Bill - Vol. 2", invade o set de filmagem de "Abril Despedaçado" e fuzila Rodrigo Santoro e toda a sua família.
Não, não foi o sol forte, presente nos dois filmes, que provocou o delírio dessa fusão de imagens. Em "O Sétimo Dia", o cineasta espanhol Carlos Saura reconstrói, com cores tarantinescas, um massacre sangrento que ocorreu realmente no verão de 1990, em Puerto Hurraco, um até então pacato povoado de Extremadura, localizado no sudoeste da Espanha. Motivo do crime: vendeta, como no filme do brasileiro Walter Salles, inspirado pelo romance do albanês Ismail Kadaré.
Em "O Sétimo Dia", tudo começa com uma história de amor entre um membro de cada uma das famílias em conflito, nos anos 60. O rapaz seduz a moça e a abandona. Na seqüência, é assassinado pelos parentes dela, que, por sua vez, têm a casa destruída e a mãe queimada pelo irmão do morto.
O ciclo de ódio só faz aumentar por conta de uma disputa de terras e com a demência progressiva de Luciana, o estopim de toda a confusão, interpretada por Victoria Abril -mais conhecida por seus papéis almodovarianos.
Apesar das comparações acima, "O Sétimo Dia" é um legítimo produto da "oficina Saura". Entre as características mais marcantes do diretor de "Cría Cuervos" (76), "Ay, Carmela!" (90) e "Goya" (99), a preocupação com a fotografia e a busca por uma "Espanha profunda" se ressaltam.
Com o tema do país cindido em dois, Saura reaviva traumas nacionais desde o tempo das disputas ideológicas da Guerra Civil.
O massacre de Puerto Hurraco chocou pela brutalidade primitiva uma Espanha que, naqueles anos 90, sob o governo do socialista Felipe González, se julgava moderna e próspera e via cada vez mais distante o país arcaico e pobre que fora durante o franquismo.
Saura escancara a triste ironia que Puerto Hurraco representou. Ironia que ele procura estender até os dias de hoje, em cenas sutis como aquela em que a garota Isabel, poucos dias antes da matança, diz, entediada com a vida no vilarejo: "Eu queria viver em Madri, para ver na rua os jogadores de futebol, os cantores".


O Sétimo Dia
El Séptimo Dia
   
Direção: Carlos Saura
Produção: Espanha, 2004
Com: José Luiz Gómez, Juan Diego, José Garcia, Victoria Abril
Quando: a partir de hoje no Frei Caneca Unibanco Arteplex e no HSBC Belas Artes/Sala Mário de Andrade


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