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Stones dão razões para gostar de rock
MARCELO OROZCO
do "NP"
Telão, fogos, explosões, produção high-tech, tudo impressionante e de alta qualidade. Mas o importante no show dos Rolling Stones em São Paulo, segunda à noite
no Ibirapuera, foi a amostra da essência musical da banda, numa
parte que poucos realmente viram.
Em três músicas na metade do
show, os Stones se instalaram num
palco minúsculo no meio da platéia. O telão foi desligado e tudo
dependeu apenas do rock sujo,
mais distorcido (embora menos
potente em decibéis) que o produzido no palco principal.
Dando a ilusão de que estão em
um bar em 1963 ou em um palco
da primitiva era dos grandes
shows em 1969, os Stones declaram que ainda sabem fazer (e muito bem) rock básico, sem acessórios. Apenas ficaram grandes demais e não podem voltar atrás a
noite inteira.
Musicalmente, o ponto é provado pela escalação das canções no
minipalco. Após a cover de um
rock'n'roll do pioneiro Chuck
Berry, "Little Queenie", e de "Under My Thumb", gravada em 66,
os Stones tocam "You Got Me
Rocking", feita em 94.
Ali, esse rock recente deixa de ter
a cara estéril que recebeu em estúdios moderníssimos e parece
composto na mesma leva dos clássicos ardidos do período entre 68 e
72.
Só que, sem telão, a maioria do
público fica órfão. Ouve, curte e
mal vê o que acontece, proporcionando diálogos como este entre
uma moça loira e seu namorado,
ambos de estatura mediana: "Você
enxerga, amor?" "Não. Tem um
"cabeção' logo lá na frente".
Após demonstrar que, no fundo,
os cinquentões são os mesmos
meninos maus de 30 anos atrás, os
Stones voltam ao palco principal
para a sequência final eletrizante.
Então, a banda traduz a essência
exibida no minipalco para as proporções gigantescas necessárias
para um público tão grande como
o do Ibirapuera.
Com uma pegada maior que a do
show de sábado no Rio, os Stones
fazem a multidão dançar, cantar e
esquecer o atraso de quase 50 minutos e o cansaço.
A vibração é sentida. O satisfeito
"too much!" ("Demais!") proferido por Keith Richards em um close do telão durante "Start Me Up"
bem poderia ser mais um jogo de
cena dos inúmeros ensaiados pelos Stones. Porém, com tanta gente pulando com alegria genuína, a
exclamação soa espontânea.
É o clímax construído desde o
início pelo grupo com o melhor
domínio de um espetáculo. O que
vem antes é aquecimento para o
que todos esperam: rock'n'roll jogado na cara.
Até a metade, o show vai crescendo com "Satisfaction" para
despertar, músicas novas para
promover o álbum "Bridges to
Babylon", o obrigatório "Like a
Rolling Stone" com Bob Dylan
(mais bagunçado que no Rio), as
saudações de Mick Jagger em algo
que lembra português e os dois
números com Richards cantando.
No geral, os Stones, velhos, enrugados e ainda mestres em sua
arte, lembraram em 22 músicas as
razões para gostar de rock, por
suas virtudes e defeitos.
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