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Boleiros
Em "Boleiros", filme que estréiano próximo dia 24, Ugo Giorgetti usa o futebol para falar da vida
JOSÉ GERALDO COUTO
da Equipe de Articulistas
"Boleiros", a saga futebolística
de Ugo Giorgetti, chega finalmente às telas. O filme tem pré-estréia
hoje em São Paulo, promovida pela Folha, Espaço Unibanco de Cinema e canal Multishow.
No próximo dia 24, "Boleiros"
estréia em São Paulo e em Curitiba. No Rio e em Porto Alegre, entra em cartaz em maio.
Giorgetti -diretor também de
"Festa" e "Sábado"-falou à Folha sobre cinema e futebol.
Folha - Além de retratar o mundo
do futebol, "Boleiros" pode ser visto também como uma crônica da
cidade de São Paulo, não é?
Ugo Giorgetti - Não gosto muito de filmes não localizados. Acho
que o filme deve ter endereço. Isso
lhe dá caráter, personalidade. Gosto de filmes em que você vê que as
coisas se passam de um determinado jeito porque aquele lugar é
daquele jeito.
Eu não teria como escapar disso.
Mesmo que não mostrasse fisicamente a cidade, ela acabaria aparecendo de outra forma: no sotaque,
no jeito de falar.
Folha - E o público que não gosta
de futebol? Vai gostar do filme?
Giorgetti - Espero que sim.
Procurei fazer um filme que as
pessoas não precisassem entender
nada de futebol para segui-lo. Em
parte, acho que consegui, porque
no fundo "Boleiros" fala de pessoas, de seres humanos. O futebol,
na verdade, é um pretexto para filmar aquele universo de pessoas.
Agora, é evidente que, se o cara
odeia futebol, ele pode ter uma resistência. Mas aí, ele poderia também odiar sábados, ou odiar festas
(referência aos longas anteriores
do diretor). Nas exibições fechadas
que fizemos de "Boleiros", convidei pessoas que não gostam de futebol e elas gostaram do filme.
Folha - As mulheres que aparecem em "Boleiros" são a "Amélia",
a burguesa e a boazuda. Isso pode
desagradar o público feminino?
Giorgetti - Acho que não, porque as coisas se passam mais ou
menos assim nesse universo do futebol. Aliás, do esporte em geral.
Você se lembra da mulher do Jake
La Motta, no "Touro Indomável"?
Ela só apanhava.
Além disso, a personagem da
Denise Fraga não é tão "Amélia"
assim. Ela se revolta, vai atrás do
cara, arma um escândalo.
Folha - Um dos pontos altos do
filme são os personagens populares, interpretados por desconhecidos. Como você encontrou as pessoas certas para esses papéis?
Giorgetti - Testes. A palavra é
essa. Botei gente pesquisando, a
partir de algumas recomendações
básicas. Por exemplo: um Gavião
da Fiel tem de parecer um Gavião
da Fiel. Não adianta vir com um
ariano, de gravata. Você tem que
acreditar no sujeito.
Depois disso, a gente fez testes
em vídeo. E você tem que ver também o sujeito no conjunto. Os três
gaviões, por exemplo. Só depois
que vi os três juntos, vestidos com
o uniforme da torcida, achei que
eram aqueles mesmo. Eles formavam um conjunto acreditável.
A Fátima Toledo (preparadora
de atores) deu uma treinada no
Cléber Colombo, que faz o Azul, e
no André Bicudo, que faz o Caco.
O André, aliás, jogou futebol no
Santos e no Santo André, o que dá
mais veracidade a sua atuação.
Folha - Seu filme, apesar de muito engraçado, tem um tom indisfarçavelmente melancólico. Isso
tem a ver com sua visão da decadência do futebol, com a idade ou
com sua visão de mundo?
Giorgetti - Talvez tenha a ver
com isso tudo, mas o principal é o
seguinte: o que é triste é a carreira
do jogador de futebol.
Vou dar um exemplo. Uma vez
eu estava fazendo um comercial de
Cinzano e precisava de um boleiro.
Alguém sugeriu o Basílio, que tinha sido do Corinthians. Exatamente naquela semana, o Basílio
estava ameaçando parar. Eu lia no
jornal: "o velho Basílio", "o veterano Basílio".
Aí apareceu o "velho Basílio":
era um jovem de 33 anos. Quer dizer, negócio mais melancólico do
que isso eu não conheço.
As frases amargas do filme não
são minhas. Quando o personagem do Flavio Migliaccio diz que
olha as fotos na parede e se pergunta se aquilo aconteceu mesmo
com ele, está repetindo uma frase
do Luisinho, o Pequeno Polegar,
numa entrevista à TV Cultura.
A frase do técnico -"Nunca sonhei que estou no banco, orientando o time; sempre sonho que
estou jogando"- foi dita pelo Pepe no programa do Jô Soares.
Folha - Como foi o contato com
jogadores e ex-jogadores para a
produção do filme?
Giorgetti - O Zé Maria e o Luís
Carlos (ex-jogadores do Corinthians), além de aparecer no filme,
deram uma assessoria técnica.
Além disso, falamos com dezenas
de jogadores, para que autorizassem a utilização de fotos suas ou de
seus nomes na locução radiofônica final, de um jogo imaginário.
Alguns pediram dinheiro e não
tínhamos condições de pagar.
Mas, a recusa mais tocante foi a de
Jair da Rosa Pinto. Quando a produção o procurou, ele respondeu:
"Quero esquecer que fui do futebol. Não quero falar desse assunto
nunca mais. Por favor, não insistam".
Folha - Como você escalaria a seleção brasileira para a Copa?
Giorgetti - Eu tiraria o Dunga
para colocar alguém capaz de dar
um passe de três metros. O time
podia ser: André; Cafu, Júlio César, Cléber e Roberto Carlos; Dejair (ou qualquer outro que não erre passe), César Sampaio, Raí e Rivaldo; Muller e Ronaldinho.
Folha - E a sua seleção brasileira
de todos os tempos?
Giorgetti - Aí é difícil. Como escolher entre Djalma Santos e Carlos Alberto Torres, entre Dirceu
Lopes e Ademir da Guia? Mas vamos lá: Gilmar, Carlos Alberto,
Djalma Dias, Mozer e Nilton Santos; Cerezo, Ademir da Guia e Pelé;
Garrincha, Tostão e Canhoteiro.
Mas, pô: ficaram de fora Júlio Botelho, Dino Sani, Chinesinho, Sócrates, Zico, Falcão...
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