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ANÁLISE
Violência é perversamente traduzida na TV
ESTHER HAMBURGER
ESPECIAL PARA A FOLHA
No Japão, a TV não exibe as
imagens dos atentados de 11
de Setembro. É incrível como
aberrações que se tornaram corriqueiras, quase naturais, não o são
do outro lado do planeta. Apesar
da globalização, da uniformização tecnológica etc. e tal.
Se o choque dos aviões nas torres do World Trade Center, e o
posterior megadesmoronamento
que se seguiu, não aparecem na
TV japonesa, o que dizer da recente tragédia envolvendo a escola cheia de crianças na Ossétia?
Ou das cerca de 40 explosões
que marcaram o domingo, 12 de
setembro, no Iraque? Com direito
a imagens de um jornalista morto
"em combate", quando reportava
diretamente das ruas de Bagdá?
As imagens da tragédia nova-iorquina foram espetaculares. A
ação foi concebida e reverberou
como tal na mídia ocidental.
As imagens recentes da escola
russa são de outro tipo. Elas revelam detalhes de corpos feridos,
pessoas amarradas a bombas.
Sem nenhum efeito especial, a
crueza atingiu em Beslan os limites do tolerável.
O atentado tchetcheno celebrou, com alguns dias de antecedência, o aniversário do evento
cujo significado para o império
americano talvez possa ser comparado ao da queda do muro de
Berlim para o império soviético.
O acirramento da violência nas
mais diversas esferas da vida contemporânea -das relações pessoais às internacionais- se traduz de maneira perversa na telinha. Ao menos na metade ocidental do globo.
A ausência de imagens consideradas muito violentas na TV japonesa, além de curiosa, decorre de
convenções culturais que protegem as pessoas do excesso de intimidades e de inconveniências.
Revela mecanismos estratégicos
da guerrilha contemporânea.
Explosões via satélite queimam
imagens condenadas em diversas
culturas, corroendo, por dentro,
países de mídia livre.
Diante das imagens de Beslan,
dá vontade de viajar para o Japão.
Esther Hamburger é antropóloga e
professora da ECA-USP
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